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postado em: 19/12/2008
Santa Coerência Pregar e não viver a mensagem é roubar-lhe o poder Acabáramos de assistir ao filme Ghost, do Outro Lado da Vida. Ainda bem que no escuro do cinema ninguém conseguia ver meus olhos rasos d’água. Está certo que não acreditei em nada do que vi e ouvi, mas o cinema é assim mesmo: tem o grande poder de nos envolver e manipular nossos sentimentos. Devia ser umas 22h30 ou 23 horas. O frio era tão grande que eu não tinha coragem de tirar as mãos do bolso para conferir a hora, e o relógio da torre da Igreja Matriz estava escondido pelos prédios. De qualquer forma, estava bastante tarde para minha amiga Simone ir para casa sozinha. Dispus-me a levá-la até sua casa e despedimo-nos de nossos outros amigos que também estavam assistindo ao filme. À medida que caminhávamos pelas ruas já desertas (eram poucos os que se aventuravam a encarar a brisa enregelante dos invernos criciumenses, lá no sul de Santa Catarina), Simone partilhava comigo os sérios problemas pelos quais sua família estava passando. Segundo ela, seu pai estava agindo de maneira estranha ultimamente. Por duas ou três vezes suas feições ficaram transtornadas e sua voz, modificada. Nessas ocasiões, ele dizia ser a avó de minha amiga. E o maior problema é que essa avó já era falecida. – Mas como vocês podem ter certeza de que não é uma brincadeira, algum problema mental, ou coisa parecida – perguntei, tentando sondar todas as possibilidades, antes de manifestar o pensamento que já tomava forma em minha mente. – Michelson, você deveria ver aquilo. Ele fala com a voz dela! É muito estranho e não acredito que seja uma simples doença. – Por que não? – Numa dessas ocasiões em que meu pai disse ser a mãe dele, chegou a mencionar um objeto que eu havia perdido algum tempo atrás. – E o que tem isso? – Só eu e minha avó sabíamos disso! – Você tem certeza? – Absoluta. Além do mais, minha mãe também disse que não tem como explicar de outra forma certas coisas que meu pai diz e faz nesses momentos. – E o que vocês acham que significa tudo isso – perguntei, já prevendo a resposta. – Que é o espírito de minha avó. Só não sei por que ela está fazendo isso com a nossa família. Fiquei em silêncio por alguns segundos, pensando em como dizer o que eu estava pensando, afinal, não sabia o que poderia ser pior: um suposto espírito de morto ou o que eu suspeitava que realmente estivesse acontecendo. – Sabe, amigo – ela continuou falando, quebrando o silêncio, – somos muito católicos e jamais pensamos em recorrer ao espiritismo. Mas acho que só temos essa opção agora. Imediatamente pensei em como o mal nos empurra para certas armadilhas. E justamente naquela noite tínhamos que assistir Ghost – um filme declaradamente espírita? Bem, de qualquer forma era uma oportunidade que eu tinha para falar-lhe sobre o que a Bíblia ensina sobre o estado dos mortos. E eu aproveitei a chance. – Simone, preste bem atenção ao que vou lhe dizer. Tenho estudado bastante a Bíblia ultimamente, como você deve saber, e o melhor conselho que posso lhe dar é: não busque a ajuda do espiritismo. Nos minutos seguintes, enquanto caminhávamos pelas ruas desertas, a meio caminho da casa de minha amiga, expliquei-lhe tudo o que eu estava descobrindo em meus estudos bíblicos. Que, na verdade, o maior interessado em divulgar idéias errôneas sobre o estado do homem na morte é Satanás. Disse-lhe que tudo o que havíamos visto aquela noite, naquele filme, não passava de uma ilusão diabólica ¬Estávamos já bem próximos da casa da Simone quando, de repente, algo muito estranho aconteceu. Na verdade, creio que foi a sensação mais assustadora pela qual já passei em minha vida. Comecei a falar sobre o poder libertador de Cristo, e que eles deviam, sim, era estudar a Bíblia e buscar mais a Deus em oração. Enquanto falava isso para minha amiga, senti uma forte pressão no peito, como se mãos poderosas e invisíveis me estivessem apertando. Imediatamente parei de falar. O fôlego não saía. Mal conseguia respirar, e a Simone percebeu minha angústia. – O que foi, Michelson? Você não está se sentindo bem? Tentei acalmá-la, gesticulando que não era nada sério. Mas no fundo eu sabia que essa não era uma situação normal. Minha saúde era perfeita e nunca nada parecido me havia acontecido antes. Ao chegar em frente à sua casa, Simone me convidou para entrar. Naquele momento, juntamente com a falta de ar, um pavor inexplicável tomou conta de mim. Um calafrio percorreu-me a espinha, eriçando os cabelos da nuca. Era como se dentro daquela casa houvesse uma força desconhecida prestes a me destruir, a me consumir. Tentando não demonstrar meu apavoramento, disse-lhe que já estava tarde e que eu devia voltar para casa. Ela concordou e entrou pelo portão do jardim, agradecendo-me a companhia e desejando-me boa noite. Voltar para casa sozinho não foi nada fácil. Caminhei pelo meio da rua, pois tinha a nítida impressão de que olhos invisíveis me observavam por detrás das árvores, das sombras e dos muros nas calçadas. Cerrei os punhos, como que esperando o ataque de um inimigo, de algo que pudesse saltar sobre mim a qualquer momento. Nunca havia sentido tanto medo até aqueles meus 19 anos de vida. Sempre me considerei muito racional, valorizando o pensamento científico e as explicações lógicas para as coisas. Mas por mais que tentasse lutar com meus pensamentos, era impossível negar que estava vivendo uma situação sobrenatural. A respiração, aos poucos, voltou ao normal, mas continuei ofegante por estar caminhando muito rápido, quase correndo. Debaixo do blazer de lã, meu corpo todo transpirava. Queria chegar logo em casa. Seja lá o que estivesse a me seguir, eu sabia que não teria forças para enfrentar. Na verdade, era esse o pensamento que me atormentava e que, subitamente, caiu sobre mim com o peso de uma terrível revelação: não tenho forças para enfrentar o mal. Quando cheguei em casa, amaldiçoei-me por ter resolvido mudar meu quarto para o porão. Pela primeira vez na vida estremeci com a idéia de ter que dormir sozinho. Abri a porta do andar de cima e desci pela escada de madeira que dava acesso ao porão, aparentemente muito mais escuro aquela noite. Rapidamente acendi a luz. Mesmo assim, aquele estranho medo e aquela situação apavorante em frente à casa da Simone não me saíam da mente. Ajoelhei-me à beira da cama e disse a Deus em pensamento: “Senhor, perdoa-me, pois sei que tenho que tomar uma importante decisão e a tenho adiado tanto. Como tenho sido hipócrita ao pregar a outras pessoas uma mensagem que eu mesmo ainda não vivo. Obrigado por teres me protegido esta noite. Sei que Satanás poderia ter me destruído, não fosse o Teu cuidado. Ajuda-me, Senhor. Quero vestir Tua armadura. Quero ser forte contra o mal. Quero me entregar completamente a Ti. Mas preciso de Tua ajuda para dar esse passo. Por favor, não me abandones. Em nome de Jesus, amém.” Depois de orar, senti-me um pouco mais tranqüilo e seguro. Mesmo assim, resolvi deitar-me sem ir ao banheiro e dormi de luz acesa. Pelo menos por aquela noite. Áreas obscuras Esta experiência ocorreu poucos meses antes de meu batismo, no ano de 1991. Foi a primeira vez em que percebi a real importância da coerência religiosa; de viver aquilo que se prega. Afinal, “nossa posição diante de Deus depende, não da quantidade de luz que temos recebido, mas do uso que fazemos da que possuímos”. [1] “Só os que estiverem vivendo de acordo com a luz que têm recebido poderão receber maior luz. ... Aqueles que não fazem esforços decididos, mas esperam simplesmente que o Espírito Santo os force à ação, perecerão em trevas.” [2] Ellen White também diz que “sem uma viva fé em Cristo como Salvador pessoal, é impossível fazer com que nossa influência seja sentida em um mundo cético. Não podemos dar a outros aquilo que nós mesmos não possuímos”. [3] Hoje sei que a incoerência é um dos piores males na vida cristã. Por isso devemos estar atentos às “áreas obscuras” de nosso coração. 1. Vida simples e vestuário apropriado: Precisamos levar uma vida simples, gerindo com sabedoria os recursos que Deus nos outorga, e atentarmos para a mensagem que transmitimos através de nossa indumentária. “Nossa fé, caso seja vivida, levar-nos-á a ser tão simples no vestir, e tão zelosos de boas obras, que nos assinalaremos como peculiares.”4 “Nossas palavras, ações, vestidos, são pregadores vivos, juntando com Cristo, ou espalhando. Isto não é coisa insignificante, para ser passada por alto com um gracejo. A questão do vestuário exige séria reflexão e muito orar. ... Os que se apegam aos adornos proibidos na Palavra de Deus, nutrem orgulho e vaidade no coração. Desejam atrair a atenção. Seu vestuário diz: Olhem para mim, admirem-me. Assim cresce decididamente a vaidade no coração humano, devido à condescendência.” [5] 2. Temperança: “Que ninguém, dentre os que professam piedade, considere com indiferença a saúde do corpo e se lisonjeie pensando que a intemperança não seja pecado e que não afetará sua espiritualidade.” [6] Até que pregamos bastante sobre a mensagem de saúde, mas como tem sido nossa prática neste aspecto? Infelizmente, pesquisa realizada durante a última Conferência Geral, em Toronto, mostrou que muito se fala, mas pouco se vive as noções de saúde que nos foram bondosamente legadas por Deus. Sabemos da necessidade de voltar ao regime natural, mas na primeira oportunidade nos refestelamos numa “boa” churrascaria. Falamos da necessidade de exercício físico, mas damos mesmo é exemplo de sedentarismo, e, às vezes, de workaholics. Que tipo de mensagem transmitimos com isso? 3. Passatempos e conversação: “A mente natural tende ao prazer e à satisfação do próprio eu. É o método de Satanás encher a mente de desejo em torno dos divertimentos mundanos, de modo a não haver tempo para a pergunta: Como vai minha alma?” [7] “Há grande número indo após divertimentos e coisas que chamam a atenção neste mundo; a mente é deixada a divagar em demasia sobre roupas, e a língua se empenha muitas vezes em conversação leviana e frívola, o que denota a mentira de nossa profissão, pois nossa conversação não está no Céu, de onde aguardamos o Salvador.” [8] 4. Trabalho missionário: “Os que não se interessam pela causa de Deus na Terra jamais poderão cantar no Céu o cântico do amor redentor.”9 “Dando o evangelho ao mundo, está em nosso poder apressar a volta de nosso Senhor. Não nos cabe apenas aguardar, mas apressar o dia de Deus.” [10] Se nos cabe apressar a volta de Cristo com a pregação do evangelho, que mensagem damos ao mundo com a nossa letargia? Cada um sabe as áreas de sua vida que eventualmente estejam transmitindo uma mensagem incoerente. E é sempre bom lembrar de orar, como o salmista, para que Deus sonde nosso coração e veja se há em nós algum caminho mau (Salmo 139:23). Vivendo o que cremos e pregamos não só dará ao mundo uma mensagem coerente, como nos tornará verdadeiramente felizes. Afinal, nada mais triste que um coração dividido. Referências: 1. O Desejado de Todas as Nações, pág. 217. 2. Eventos Finais, pág. 169. 3. O Maior Discurso de Cristo, pág. 37. 4. Mensagens aos Jovens, pág. 353. 5. Testemunhos Seletos, vol. 1, págs. 596 e 599. 6. Santificação, pág. 27. 7. Mensagens aos Jovens, pág. 373. 8. Primeiros Escritos, pág. 111. 9. Primeiros Escritos, pág. 50. 10. O Desejado de Todas as Nações, pág. 643.