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postado em: 1/5/2016
"A Bíblia é a história mais antiga e compreensiva que os homens possuem. Procedeu diretamente da fonte da verdade eterna, e no decorrer dos séculos uma mão divina tem preservado a sua pureza. Ilumina o remoto passado, onde a pesquisa humana em vão procura penetrar. Somente na Palavra de Deus contemplamos o poder que lançou os fundamentos da Terra e estendeu os céus. Unicamente ali encontramos um relato autêntico da origem das nações. Apenas ali se apresenta a história de nossa raça, não maculada do orgulho e preconceito humanos." (Educação, p. 173)
É compreensível que muitos cristãos não apreciem estudar estatística ou física quântica. Contudo, nunca entendi como algum cristão - especialmente como algum cristão adventista do sétimo dia - possa não se interessar pela história. Como afirmou o grande historiador Marc Bloch (1886-1944), um dos precursores do Movimento dos Annales (que revolucionaria a historiografia ao longo do séc. XX), o cristianismo "é, por essência, uma religião histórica".
Mesmo sem o saber, Bloch estava ecoando Ellen G. White, que na citação acima deixa claro que a Bíblia é a fonte histórica de "ouro" de todos nós. E ao estudarmos a história, tendo sempre em vista essa grande Fonte, percebemos Deus como o grande Capitão a quem cabe a condução geral do "navio" da humanidade. Os seres humanos, por sua vez, têm a sua liberdade relativa respeitada por esse Guia. Essa ilustração é do grande erudito adventista Siegfried J. Schwantes, que conclui: "a Providência faz uso de diferentes alternativas para dirigir a sequência de acontecimentos de acordo com Seu plano. Esta soberania divina é admissivelmente discreta, de modo a não frustrar a liberdade humana por um lado, e por outro não privar a necessidade de cada qual andar pela fé" (Diálogo, vol. 11, nº 1, pp. 13-16).
O adventista estudioso da história perceberá como, através dos séculos, a Providência e a liberdade humana se combinaram no cumprimento das profecias. Nossa interpretação historicista das profecias requer mais que uma leitura superficial das Escrituras e de outros materiais de apoio. Afinal, embora a "nossa história mais antiga" (a Bíblia) tenha procedido diretamente da "fonte da verdade eterna", obviamente ela não é um "livro-texto onisciente" (cf. o Cap. 11 do livro Mitos na educação adventista, de George Knight). Na Palavra de Deus, encontramos sobretudo as "grandes questões", uma "moldura de referência dentro da qual devemos estudar e interpretar todos os tópicos" (idem, p. 138). Tal "moldura" nunca pretendeu ser um oráculo, fornecendo respostas sobre tudo. Ainda que muitas lacunas dos profetas canônicos possam ser preenchidas pela nossa profetisa moderna (Ellen G. White), ainda assim precisamos recorrer às mais diversas fontes históricas (inclusive arqueológicas) e estudos especializados. Tal estudo exigirá algum desprendimento, esforço e disciplina, mas se mostrará muito recompensador.
A história é a mestra da vida, dizia Cícero (106-43 a.C.). Sem ela, nossa identidade, nossa referência e até nossa fé desaparecerão. "Porque tudo o que dantes foi escrito, para nosso ensino foi escrito, para que pela paciência e consolação das Escrituras tenhamos esperança" (Romanos 15:4). Não é à toa que a apostasia tem se alastrado em nossas igrejas. A mentalidade pitagórica e consumista ocidental contaminou-nos de tal forma que vivemos para o aqui e agora, e achamos que a história não tem importância. Em nossas igrejas, somos tentados a imergir num oceano de reuniões e programas, desenvolvendo uma experiência religiosa desconectada da essência da nossa fé. A consequência inevitável é o desinteresse pelos textos antigos e inspirados, o que em última análise gera uma debandada crescente e preocupante. O adventismo enfrenta hoje esse dilema: ou extrai a sua força do passado (estudo das profecias e sua confirmação ao longo da história), cumprindo sua missão presente (pregação do Evangelho a todo o mundo) e mira para o futuro (volta de Jesus), ou vive um eterno presente, numa rotina de frivolidades, vazia e sem identidade.
Esta coluna pretenderá dar a sua singela contribuição para que, ao olharmos para o passado, continuemos cumprindo nossa missão profética. Como disse aquela Mensageira do Senhor falecida há um século, "nada temos a temer quanto ao futuro, a menos que nos esqueçamos a maneira em que o Senhor tem nos guiado, e Seu ensino em nossa história passada." (Testemunhos Seletos, vol. 3, p. 315)