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postado em: 9/12/2015
Vendo o Que o Olho Não Vê
Estou em pé a seis passos da borda do leito. Meus braços estendidos. Mãos abertas. Sobre a cama, Sara, com seus quatro anos, encolhida, adota uma pose como um gatinho brincalhão.
Vai pular. Porém, não está pronta. Estou demasiado perto.
— Mais para trás, pai — me desafia em pé.
Dramaticamente acedo, confessando admiração pelo seu valor.
Depois de dar dois passos gigantes me detenho.
— Mais? — pergunto.
— Sim! — berra Sara, pulando sobre a cama.
Ante cada passo ri, aplaude e faz gestos pedindo mais. Quando já estou do outro lado do canhão, quando estou fora do alcance do homem mortal, quando sou somente uma pequena figura no horizonte, ela me detém.
— Ali, pára ali.
— Está certa disso?
— Estou certa — grita ela.
Estendo meus braços. Mais uma vez ela se encolhe, depois pula. Superman sem capa. Pára-quedista sem pára-quedas. Só seu coração voa mais alto que seu corpo. Nesse instante de vôo sua única esperança é seu pai. Se ele for fraco, cairá. Se ele for cruel, ela baterá contra a parede. Se for distraído, tombará no chão.
Mas ela não conhece tal temor, porque conhece o seu pai. Ela confia nele. Quatro anos sob o mesmo teto a convenceram de que ele é confiável. Não é sobre-humano, mas é forte. Não é santo, mas é bom. Não é brilhante, mas não é necessário que o seja para pegar sua filha quando pula.
De modo que voa.
De modo que remonta.
De modo que a apanha e os dois se regozijam ante a união entre a confiança dela e a fidelidade dele.
Estou de pé a pouca distância de outra cama. Desta vez ninguém ri. O local tem aspecto solene. Uma máquina bombeia ar para um corpo cansado. Um monitor mede o ritmo das batidas de um esgotado coração. A mulher no leito não é nenhuma criança. Uma vez o foi. Faz décadas. O foi. Porém agora já não é.
Assim como Sara, ela deve confiar. Depois de poucos dias de ter sofrido uma cirurgia, acabam de informá-la que deverá fazer outra. Sua fraca mão aperta a minha. Seus olhos se umedecem de temor.
Diferente de Sara, não vê pai algum. Mas o Pai a vê. Confie nEle, digo para o bem de ambos. Confie na voz que sussurra seu nome. Confie em que as Mãos vão lhe segurar.
Estou sentado perante uma mesa, em frente de um homem bom. Bom e assustado. Seu temor tem fundamento. As ações desceram. A inflação subiu. Não é que tenha dilapidado nem apostado nem jogado. Trabalhou intensamente e orou com freqüência, mas agora tem temor. Sob o traje de flanela se oculta um tímido coração.
Mexe seu café e fixa seu olhar como os olhos do Coiote que acaba de perceber que correu além da borda do precipício. Está a ponto de cair e cair rapidamente. É Pedro sobre a água, que olha para a tormenta em vez do rosto. É Pedro em meio das ondas, que escuta o vento e não a voz.
Confie, eu o animo. Mas a palavra cai como uma pedra. Não está acostumado a algo tão estranho. É um homem de lógica. Ainda quando a pipa se esconde por trás das nuvens continua agarrada ao fio. Porém agora o fio escorregou. O céu está em silêncio.
Estou de pé a pouca distância de um espelho e vejo o rosto de um homem que fracassou... falhou com seu Criador. Outra vez. Prometi que não o faria, mas o fiz. Fiquei calado quando devia ter gritado. Sentei-me quando devi ter adotado uma postura.
Se esta fosse a primeira vez, seria diferente. Mas não o é. Quantas vezes alguém pode cair e ter a expectativa do resgate?
Confiar. Por que é fácil dizê-lo aos outros e tão difícil lembrá-lo a nós mesmos? Deus sabe o que fazer com a morte? À mulher eu disse que sim. Deus sabe o que fazer com a dívida? Isso foi o que comuniquei ao homem. Deus pode ouvir outra confissão destes lábios? O rosto no espelho pergunta.
Estou sentado a pouca distância de um homem condenado à morte. Judeu de nascimento. Fabricante de tendas por oficio. Apóstolo por chamamento. Seus dias estão contados.
Tenho curiosidade em saber o que sustém este homem ao aproximar-se sua execução. Assim lhe faço algumas perguntas:
Você tem família, Paulo? Nenhuma.
Como vai a sua saúde? Meu corpo está abatido e cansado.
Quais são suas posses? Tenho muitos pergaminhos. Uma pena. Um manto.
E sua reputação? Pois não vale muito. Para alguns sou um herege, para outros, um indomável.
Você tem amigos? Sim, mas alguns deles me abandonaram.
Você tem galardões? Não aqui na Terra.
Então, o que você tem Paulo? Sem posses. Sem família. Criticado por alguns, escarnecido por outros. O que você tem, Paulo? O que você tem que valha a pena?
Reclino-me em silêncio e espero. Paulo fecha seu punho. Olhe para ele. Eu o olho. O que o sustenta? O que tem?
Estende sua mão para que eu possa vê-la. Ao inclinar-me para frente, abre seu punho. Observo sua palma. Está vazia.
Tenho minha fé. É tudo quanto tenho. Mas é tudo quanto necessito. “Completei a carreira, e guardei a fé”.
Paulo se reclina contra a parede de sua cela e sorri. E eu me reclino contra outra parede e fixo a vista no rosto de um homem que aprendeu que a vida é mais do que o olho percebe.
Pois disso se trata a fé. A fé é confiar no que o olho não pode ver.
Os olhos vêem o leão que espreita. A fé vê o anjo de Daniel.
Os olhos vêem tormentas. A fé vê o arco-íris de Noé.
Os olhos vêem gigantes. A fé vê Canaã.
Seus olhos vêem suas faltas. A fé vê seu Salvador.
Seus olhos vêem sua culpa. A fé vê o Seu sangue derramado.
Seus olhos vêem seu túmulo. Sua fé vê uma cidade cujo construtor e criador é Deus.
Seus olhos olham no espelho e vêem um pecador, um fracasso, um quebrador de promessas. Mas pela fé olha para o espelho e se vê como pródigo, elegantemente vestido, levando em seu dedo o anel da graça e em seu rosto o beijo de seu Pai.
Porém, aguarde um minuto, diz alguém. Como sei que isto é verdade? Linda prosa, mas quero fatos. Como sei que essas não são somente vãs esperanças?
Parte da resposta pode ser achada nos pulos de fé da Sara. Sua irmã mais velha, Andréia, estava no local olhando e perguntei a Sara se ela pularia nos braços da Andréia. Sara negou-se. Tentei convencê-la. Não cedia.
— Por que não? — perguntei.
— Somente pulo em braços grandes.
Se acharmos que os braços são fracos, não pularemos.
Por isso, o Pai flexionou seus músculos.
"A suprema grandeza do Seu poder para conosco, os que cremos", ensinava Paulo. "A operação da força do Seu poder, que operou em Cristo, ressuscitando-O dentre os mortos" (Efésios 1:19-20, PJFA).
Na próxima vez em que se perguntar se Deus pode resgatá-lo, leia esse versículo. As mesmas bênçãos que venceram a morte são as que lhe estão reservadas.
Na próxima vez que se perguntar se Deus pode lhe perdoar, leia esse versículo. As mesmas mãos que foram pregadas na cruz estão abertas para você.
E na próxima vez que você se perguntar se vai conseguir sobreviver ao pulo, pensa em Sara e em mim. Se um pai teimoso de carne e osso frágil ou franzino como eu pode apanhar sua filha, você não acha que seu Pai eterno poderá apanhá-lo?