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postado em: 14/11/2008
Questões Sobre a Lei – 3
* Na declaração de Cristo sobre o estabelecimento do sábado fica claro o seu objetivo como instituição somente para os judeus.
Alegação:
Os que defendem a guarda do sábado citando a declaração de Cristo de que “o sábado foi estabelecido por causa do homem” deixam de levar em conta a segunda parte da passagem, que diz que “não o homem por causa do sábado”. O texto refere-se ao homem judeu somente.
Ponderação:
Que Jesus referia-Se ao sábado semanal nesta passagem fica claro pelo contexto. Sua declaração parte de argumentos que Ele levanta junto à liderança judaico a respeito de atos e curas de doentes aos sábados. O teor dos debates de Cristo não é SE se devia guardar o sábado, nem sobre QUANDO observar o dia, e sim COMO fazê-lo, no devido espírito.
Cristo mostra noutra ocasião que em Seus atos de cura nada está fazendo contrário à lei, porque “é lícito fazer o bem aos sábados” (Mateus 12:12).
Por outro lado, também é por demais claro que Ele está Se referindo ao “homem universal” (anthropós, no grego), não ao homem judaico. Ele diz ainda que o homem-anthropós “deixará o seu pai e a sua mãe e se unirá a sua mulher”. Logo, não faz o mínimo sentido limitar as Suas palavras ao “homem judeu” porque o casamento não se limita a tal povo. Aliás, juntamente com o sábado, o matrimônio é outra instituição que deriva da criação do mundo antes do ingresso do pecado.
Mas será que a segunda parte do versículo anula a declaração da primeira? De modo nenhum, pois, ao contrário, além de que isso poria Jesus em contradição, o fato é que essa segunda parte confirma a intenção de Cristo em mostrar a importância e valor do mandamento que não veio abolir, e sim cumprir (ver Mateus 5:17-19).
Faria sentido alterar os termos da declaração de Cristo segundo o que os anti-sabatistas prefeririam? “O sábado foi estabelecido por causa do homem judeu, e não o homem judeu por causa do sábado”.
Como se percebe, a segunda cláusula torna-se inteiramente sem nexo em tal interpretação dos que combatem o sábado, evidenciando-se um sentido desnatural e claramente forçado e ilógico—“não o homem judeu criado por causa do sábado”.
Conclusão:
A segunda parte de Marcos 2:27 é confirmação da intenção de Cristo em corrigir os excessos dos líderes judaicos quanto à guarda do sábado, e não a limitação do princípio do dia de repouso aos judeus.
Portanto, querer empregar Marcos 2:27 como argumento contra o sábado constitui-se em evidente “tiro” interpretativo que sai pela culatra.
* Não diz Tiago Que Não É Mais Para Seguir a Lei em Tiago 2:10 ao dizer que “quem tropeça em um só ponto, se torna culpado de todos”?
Tiago menciona alguns mandamentos do Decálogo mostrando a impossibilidade de observar plenamente a lei, pois a época da lei passou, agora vivemos sob a graça. Assim, se alguém falhar em cumprir um mandamento, torna-se culpado de todos ou terá que observar todos integralmente, inclusive as regras das cerimônias, o não cortar as pontas das barbas, etc.
Tiago acentua, pelo contexto, não que os cristãos têm agora uma regra de obediência menos rigorosa, e sim que devem viver em consonância com a “lei régia”—“amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Tia. 2:8).
O fato de mostrar que quem guarda toda a lei mas tropeça num só ponto falhou em cumpri-la e violou todos os preceitos é em função de toda a discussão no capítulo—a necessidade de coerência entre os crentes, o não fazer acepção de pessoas, a demonstração de dedicação plena a Deus e ao semelhante.
Tenhamos em mente que quando Tiago escreveu sua epístola, o véu do Templo já estava rasgado há muitas décadas e ele, bem como seus leitores imediatos, sabiam disso.
Portanto, Tiago não está insinuando que não é mais para observar a lei por esta ter sido abolida, ou que quem buscasse cumprir a lei dos Dez Mandamentos, para não falhar em nada também devia cumprir os muitos preceitos cerimoniais pois estes últimos já estavam abolidos ao terem cumprido sua função prefigurativa.
Antes que dar a entender que já que não se consegue cumprir a lei perfeitamente podemos relaxar quanto à observância de algum mandamento (ou alguns), as palavras do Apóstolo realçam o mesmo princípio exarado por Cristo: “Sede vós perfeitos, como perfeito é o vosso Pai celeste” (Mat. 5:48).
O próprio contexto fala em necessidade de obediência, não o contrário disso: “Falai de tal maneira, e de tal maneira procedei, como aqueles que hão de ser julgados pela lei da liberdade. Porque o juízo é sem misericórdia para com aquele que não usou de misericórdia” (Tia. 2:12 e 13). A “lei da liberdade “é uma designação que o Apóstolo atribui à mesma lei da qual está citando e que contém os mandamentos “não adulterarás “e “não matarás” (vs. 11).
Logo, em lugar de desejar pregar o fim da lei ou que podemos relaxar quanto ao cumprimento de suas exigências, Tiago reforça a necessidade de obediência perfeita, tal como o próprio Cristo acentuou em Mateus 5:19, 20, o que só se consegue sob a influência do Espírito de Deus que nos conduziria a “toda a verdade” (João 16:13) e habitaria em nosso íntimo (João 14:23) para guardar a palavra de Cristo e os Seus mandamentos (João 14:15).
Valer-se das palavras de Tiago como pretexto para desrespeitar a lei moral divina em qualquer de seus preceitos é um “tiro” interpretativo que sai pela culatra.
* Seriam os observadores do sábado hoje os modernos judaizantes?
Os judaizantes queriam que os cristãos dos primeiros tempos voltassem às velhas regras das leis judaicas, abolidas na cruz, e decerto eram agitadores da questão do sábado juntamente com a circuncisão (ver Atos 15).
O primeiro concílio da Igreja reuniu-se para dar fim à influência deles e nada recomenda sobre a guarda do sábado, o que prova que não temos que nos preocupar mais com a observância de tal dia, só aplicável aos judeus da velha dispensação.
Sabe-se quão importante era a guarda do sábado para a vida religiosa e mesmo cultural dos judeus e quão arraigados eram em sua observância, havendo até excessos de zelo nisso, como nos conflitos de Cristo com os fariseus sobre o modo de observá-lo. Se a agitação dos judaizantes, registrada em Atos 15, envolvesse, além da exigência pela circuncisão, a guarda do sábado, então entre as recomendações dos apóstolos constaria algo sobre esse mandamento.
Eles trataram do que provocava dúvidas entre o povo e era assunto agitado por alguns. Mas se nada se falou do sábado, isso prova, ao contrário do que alguns dizem, que o assunto do sábado não foi agitado por aqueles zelosos judeus convertidos ao cristianismo.
Se, como se alega, a primitiva igreja de Jerusalém foi pioneira em promover a guarda do domingo por não mais sentir-se à vontade com a observância do sábado judaico, esperar-se-ia encontrar em tal igreja uma ruptura imediata das tradições e culto religiosos judaicos. Deu-se, porém, exatamente o oposto. Tanto o livro de Atos quanto vários documentos judaico-cristãos, como do historiador palestino Epifânio, claramente revelam que a composição étnica e orientação teológica da igreja de Jerusalém eram profundamente judaicas.
A caracterização da igreja de Jerusalém, segundo Lucas, de serem seus integrantes “zelosos pela lei” (Atos 21:20), é uma precisa descrição que dificilmente permite ver o abandono de um dos principais preceitos da lei, qual seja, o sábado.
Alguns às vezes citam Atos 15:5 que fala de como esses judaizantes insistiam em que os novos conversos observassem “a lei de Moisés” para dar a entender que isso provaria que o sábado estava em discussão também. Só que se esquecem que, nesse sentido, a “lei de Moisés” não se limitava ao sábado e circuncisão, mas também ao “não matarás”, “não furtarás”, “honra o teu pai e a mãe” . . .
O silêncio quanto ao sábado nas resoluções do concílio de Jerusalém indica que os judaizantes não estavam buscando restaurar o que já era universalmente aceito pelos cristãos da época—a observância do sábado.
Esta é a razão de não haver recomendação alguma quanto à questão do dia de observância entre as coisas recomendadas: “que se abstenham das contaminações dos ídolos, bem como das relações sexuais ilícitas, da carne de animais sufocados e do sangue” (Atos 15:20).
É óbvio que o episódio dos judaizantes comprova a vigência do mandamento do sábado entre os cristãos primitivos, não o contrário. Documentos históricos demonstram que os cristãos de Jerusalém, instalados em Pela após a destruição de Jerusalém em 70 AD, onde eram conhecidos como “nazarenos”, observavam o sábado até o IV século da Era Cristã.
Usar, pois, o episódio dos judaizantes contra a vigência do sábado constitui outro claro “tiro” interpretativo que sai pela culatra.
* Em Hebreus capítulos 3 e 4 o autor não fala claramente que o sábado é mero símbolo da nova vida em Cristo?
Sendo que o autor emprega repetidamente a ilustração do sábado para falar do repouso para o povo de Deus nos capítulos 3 e 4 de Hebreus, é intenção dele ressaltar esse aspecto simbólico, prefigurativo do sábado.
Portanto, sendo mero símbolo do repouso espiritual que encontramos em Cristo, ao aceitá-Lo pela fé o sábado deve ser deixado de lado por ter cumprido essa sua função de símbolo do descanso no Senhor.
Paulo não considerou a lei abolida e sim em vigor (ver Rom. 7:7; 13:8-10 e Efés. 6:1-3), pois declarou: “Anulamos, pois, a lei pela fé? Não, de modo nenhum, antes confirmamos a lei (Rom. 3:31).
Há quem goste de acentuar que todos os 10 mandamentos são repetidos no Novo Testamento, menos o do sábado. Se for assim, não pareceria estranho pensar que por 30 anos os filhos dos pais cristãos podiam chutar a canela, xingar, desobedecer como quisessem seus progenitores até que Paulo, pelo ano 60 AD, lembrou-se de “restaurar” o quinto mandamento (Efés. 6:1 e 2)? E assim mesmo, só para os efésios, pois até tal conhecimento abranger todo o corpo de cristãos do mundo, levaria mais umas décadas. . .
Em Hebreus 3 e 4 o autor ilustra o descanso espiritual que o crente obtém em Cristo. Em todo o desenvolvimento de sua discussão ele usa o termo grego katapausin para “descanso”, mas quando chega no 4:9 a palavra utilizada é sabbatismos, que, aliás, aparece com exclusividade em tal texto.
O autor de Hebreus ilustra a questão do descanso espiritual do povo que foi perdido, ou poderia ser desfrutado (dependendo da decisão de cada um), com base no mandamento do sábado. Por aquelas alturas, em torno de 65 AD, se o domingo tivesse sido adotado pela comunidade cristã, seria natural que ele ilustrasse esse “repouso” com o descanso dominical. . .
Então, o fato de empregar o sábado como ilustração é altamente significativo. O verso 9 diz, segundo tradução livre compatível com o original: “Resta um descanso do sábado do sétimo dia para o povo de Deus”.
O sentido de sabbatismos segundo se constatou em outras literaturas gregas e judaicas é esse. A palavra significa simplesmente isso—observância do sábado semanal. Por todo o capítulo 4 o autor vale-se do termo katapausin que é “descanso” de modo genérico, mas parece que ao encerrar o seu arrazoado quis recordar aos leitores “hebreus” que ele não estava descartando o descanso literal do 7o. dia ao acentuar o descanso espiritual que se encontra em Cristo.
Sobre o sábado ser símbolo do descanso espiritual em Cristo, o fato é que uma coisa não exclui a outra. Embora como nação Israel falhasse nesse ideal, houve dentro do povo eleito os que fielmente entraram no repouso de Deus, como os heróis alistados em Heb. 11. E acaso, esses que “entraram no repouso” espiritual deixaram com isso de observar o sábado semanal? De modo nenhum, como no exemplo de Davi que declarou: “Agrada-me fazer a Tua vontade, ó Deus meu; dentro em meu coração está a Tua lei” (Sal. 40:8). Tais palavras representam o que seria o ideal para todo o povo de Deus.
Hebreus 3 e 4 são evidências adicionais de que o sábado é tratado de modo muito especial pelo autor. Os capítulos 7 a 10 tratam do sentido de todo o cerimonialismo de Israel, e se o sábado tivesse mera função simbólica, cerimonial, seria discutido nesses capítulos.
Contudo, recebe é tratamento especial nos caps. 3 e 4, indicativo de que é ainda o repouso que “resta” ao povo de Deus. Empregar, pois, Hebreus 3 e 4 para contrariar a verdade do sábado é outro evidente “tiro” interpretativo que sai pela culatra.
Autor: Prof. Azenilto Brito