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postado em: 5/4/2009
Todas as pessoas que chegam de avião à cidade do Rio de Janeiro ficam impressionadas com a beleza do cenário natural composto pelas montanhas que brotam irregularmente da terra furando as nuvens azuis ou contrastando com a bela costa atlântica. E, para acrescentar mais solenidade a essa cena, existe a figura dominante do Cristo Redentor, abençoando a cidade, o oceano e o mundo todo.
Para mim, essa paisagem lembra sempre como a vida, a morte e a ressurreição de meu Senhor – Jesus, o Cristo – devem dominar todo o meu pensamento, experiência e limitado conhecimento do eterno e imutável Deus.
Genealogia
Sempre me vem à mente minha própria origem como adventista do sétimo dia cada vez que vejo a lista genealógica greco-hebraica apresentada por Paulo. É fácil sentir um certo orgulho de minha família de pioneiros adventistas na Inglaterra. Mas isso nada significa, nem me acrescenta nada quando olho para a cruz de Cristo – que domina acima de toda história ou realizações humanas, ou mesmo esforço da igreja.
Da mesma forma que Paulo e aqueles judeus que se tornaram seus irmãos e irmãs em Cristo, nós adventistas temos uma profunda devoção à lei de Deus. Apesar de não adotarmos o sistema de sacrifícios que bem caracterizava a antiga lei hebraica, adotamos uma série de atividades cristãs, responsabilidades e observâncias. Tais práticas podem com facilidade passar por obras de obediência, e nos sentirmos salvos por essas observâncias. O abençoado apóstolo, entretanto, considerava tais obras como lixo quando comparadas com a preciosidade da vida e morte de Jesus.
É bem humana essa tendência de apegar-se a determinadas práticas ou refugar outras no intuito de recomendar-se diante de Deus. Tanto que os judeus se apegaram ao sacrifício de animais, o qual era apenas uma ilustração do sangue derramado por Jesus, e perderam o seu verdadeiro significado, por isso multiplicaram as ofertas de símbolos no desejo de serem aceitos por Deus.
Semelhança
Em dado momento, minha própria experiência religiosa apresentava alguma semelhança com o que foi dito acima. Entendia a religião como o cumprimento de certas formalidades, e a cruz de Cristo estava apagada, lá ao fundo. Então fiquei conhecendo um dinamarquês que era um verdadeiro seguidor de Jesus. Falava muito mal o inglês, mas era possuído por um brilhante senso de justiça. Ele se tornou o meu modelo. A duras penas, tentava eu imitá-lo. De início, parece que estava dando certo.
Certa noite, no bulício da vida colegial, meti-me numa encrenca. Logo me lembrei do amigo estrangeiro. Como ele sairia dessa? Tudo parece que dava certo para ele. Resolvi abordá-lo.
Pois ele não me disse o que eu esperava, nem tocou no que eu achava o mais importante. Apenas falou de Jesus – Sua vida de perfeita obediência, Sua justiça, Sua agonia no Getsêmani e no Calvário, e o triunfo de Sua tumba vazia.
Comecei a ouvi-lo com má vontade, passei a escutá-lo com atenção, fiquei impressionado, passei a crer e a aceitar. Comecei a entender que Jesus fora tratado como eu merecia para que eu pudesse ser tratado como só Ele merecia. Que Ele sofrera pelos meus pecados, sem qualquer culpa, para que eu pudesse parecer justo à vista de Deus, baseado na justiça de Cristo, como se eu não tivesse culpa alguma. Ele sofreu a morte a que estava eu destinado – morte sem qualquer conforto da presença divina – para que eu pudesse ter a vida que era dEle. Pelas Suas feridas fui curado.
O que essa nova compreensão fez por mim e como passei a encarar os imutáveis mandamentos do Deus de toda a justiça? O inesperado fruto de toda essa maravilhosa providência em meu favor foi um novo, mais profundo e sincero prazer na obediência. A vontade de Deus se tornou um deleite, a Palavra de Deus uma festa, e o templo do meu corpo uma habitação para o Espírito de Deus. Passei a sentir paz.
Poder Ressuscitador
A gratidão a Deus e a alegria no Senhor transformaram o que antes era uma árdua disciplina num deleite. O que antes parecia uma pesada carga imposta por Deus se tornou num privilégio; a justiça própria deu lugar à consciência da indignidade. O que operou essa mudança? Exatamente o poder redentivo do sangue de Jesus e o poder ressuscitador de Seu Representante pessoal – o Espírito Santo.
No Espírito Santo, a desorientada alma humana tem uma nova, infinita e onipotente fonte de poder. E ela pode suprir todo e qualquer projeto ou necessidade humana. É um poder ressuscitador. É a mesma força que operou em Cristo quando Ele Se levantou da morte, e que levantará a todos os salvos que descansam na terra e no mar; é a mesma força que nos ergue acima do poder do pecado e da morte, em nossa vida diária. Nascidos do alto pelo poder remidor da cruz de Cristo e transformador do Espírito, temos nova vida – somos novas criaturas – em Jesus.
Com profunda gratidão e mais clara percepção, comecei a descobrir que o caminho que me levara até a cruz fora o mesmo anteriormente trilhado por todo filho de Deus. Lutero, Bunyan, Zuínglio e Wesley, todos eles laboraram um dia no sentido de agradar a Deus com sua própria justiça. E cada um por sua vez teve de aprender quão inócuos são os esforços humanos. Essa descoberta inicial os preparou para aceitar a justificadora graça de Cristo pela fé. Só assim suas obras se tornaram mais numerosas e verdadeiras, sem qualquer aparência de base, mas como frutos da salvação. Nós em Cristo. Cristo em nós. A relação é dupla e recíproca.
Realidades Profundas
Esses foram alguns dos primeiros reflexos do significado da vida, morte e ressurreição de Jesus que transformaram minha vida. Mas isso não foi tudo. A compreensão leva à experiência, e a experiência aprofunda a compreensão. Ao longo dos anos, tenho percebido novas e mais profundas realidades de meu Senhor.
Cheguei a compreender que algumas coisas passaram a ter novo sentido para Cristo, depois que Ele uniu a divindade com a humanidade. Entendi que o perdão nasceu no coração de Deus, antes mesmo de Ele ter criado o primeiro ser. A cruz estava no Seu coração. E a cruz é apenas uma amostra da dor que o pecado causou a Deus.
Ainda não consegui avaliar completamente o risco assumido pela divindade ao permitir que o Filho viesse para a Terra como homem. E se Cristo pecasse? Poderia Ele cair? Acho que nós todos estaríamos perdidos, mas e Ele? E o Pai? Que bênçãos o Espírito Santo poderia oferecer nessa hipótese?
Quão próximo da queda chegou Cristo? Ou o Getsêmani foi apenas uma ação teatral? Se Ele pudesse vislumbrar a gloriosa ressurreição, qual o sentido do cálice de amargura? Qual a razão do grito: “Deus Meu, Deus Meu, por que Me desamparaste”? Mat. 27:46; Mar. 15:34.
Acho que o Céu correu um risco real quando Cristo Se ofereceu para redimir o mundo perdido e o Universo ameaçado. Que exemplo de abnegação! Que inspiração para uma vida abnegada! E mais ainda: Conforme fora muito bem expresso pelo sistema sacrifical, desde o Éden, sem derramamento de sangue não pode haver perdão. A Divindade colocou-Se em risco desde antes da fundação do mundo para nos criar dotados do livre-arbítrio, à imagem de Deus. E desde então a cruz fora plantada no coração de Deus; desde a eternidade, creio eu.
Essas são as coisas profundas que a vida, a morte e a ressurreição de Cristo trazem à minha mente. E, através da eternidade – dominante como o Cristo Redentor do Rio de Janeiro –, espero que a cruz de Cristo seja mais e mais exaltada.
Autor: Gordon M. Hyde, foi diretor do Departamento de Religião do Colégio Adventista do Tennessee, Estados Unidos.