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postado em: 9/4/2009
pressuposições na interpretação das escrituras
Introdução
A noção de pressuposição(ões) desempenha uma função importante na interpretação bíblica. Todos nós mantemos várias crenças que pressupomos ou aceitamos quando deparamos com a tarefa de interpretar as Escrituras. Ninguém é capaz de se aproximar do texto bíblico com uma mente em branco.
As pressuposições delimitam as fronteiras dentro das quais a interpretação bíblica pode e deve funcionar devidamente. Também determinam o método e, por meio do método, também influenciam, a um ponto considerável, o resultado de nossa interpretação.
Em outras palavras, elas afetam diretamente nossa teologia e a autoridade que as Escrituras têm para nossa vida e para a doutrina. Por sua vez, nossa teologia influencia a identidade espiritual e teológica e, finalmente, também a missão da Igreja Adventista do Sétimo Dia.
A aceitação de pressuposições bíblicas cristãs levará a conclusões muito diferentes de, por exemplo, um compromisso com pressuposições naturalistas e mesmo ateístas. Sendo que o método de interpretação é inseparável de suas pressuposições, as respectivas pressuposições invariavelmente influenciam o resultado.
Se o método de interpretação exclui intervenções sobrenaturais, as Escrituras não serão lidas e compreendidas como relatos verdadeiros e confiáveis, mas interpretada diferentemente. Assim, ao menos até certo ponto, a conclusão pode estar implícita dentro da metodologia. O grande problema tem a ver com o método correto e adequado. Tudo o mais segue no devido curso.
Neste capítulo, sem a pretensão de sermos exaustivos, salientaremos as pressuposições básicas de uma autêntica hermenêutica bíblica adventista e descreveremos alguns princípios hermenêuticos gerais a serem derivados delas.
O desafio hermenêutico
Os intérpretes da Bíblia não podem se livrar do seu próprio passado, suas experiências, idéias fixas e noções e opiniões preconcebidas. É um truísmo aceito que neutralidade total, ou absoluta objetividade, não pode ser atingida no ato da interpretação.
A exegese e a reflexão teológica sempre ocorrem contra o pano de fundo de pressuposições fundamentais acerca da natureza do mundo e da natureza de Deus. Há, inevitavelmente, uma compreensão prévia em torno da qual o intérprete inclinará sua investigação. Mesmo os chamados pesquisadores objetivos ou de ciências exatas agora reconhecem a influência dos valores.
A espiral hermenêutica
Reconhecemos que, ao objeto sob investigação, deve ser permitida alguma influência na determinação da abordagem apropriada. Uma teologia teocêntrica requer uma metodologia teocêntrica. Qualquer compreensão pessoal prévia, tal como evolução, que questiona ou nega a dimensão sobrenatural da qual as Escrituras claramente testificam, é estranha à Bíblia e não estará à altura do tema da Palavra de Deus.
Nossas pressuposições e precompreensões devem ser modificadas e reformadas pelo texto da Sagrada Escritura e permanecer sob o controle da própria Bíblia. O texto bíblico deve ter prioridade sobre o intérprete.
Se lidamos com a Bíblia, então devemos permitir que a Bíblia determine nossas pressuposições e metodologia em vez da física, matemática ou biologia. O intérprete bíblico deve perceber que a compreensão da Bíblia aumenta por meio da reforma da mente e do coração pela leitura das Escrituras.
A sucessiva exposição à Palavra de Deus, por meio da qual o intérprete é capaz de alinhar cada vez mais sua precompreensão com a verdade bíblica, pode ser comparada a uma espiral hermenêutica.
Devemos dar lugar à Bíblia para que nos ensine suas próprias categorias essenciais. Isto habilita o intérprete bíblico a pensar cada vez mais com o texto bíblico em vez de simplesmente pensar acerca do texto da Bíblia.
Assim, "Deus mesmo, por meio da Bíblia e do Espírito Santo cria no intérprete as pressuposições necessárias e a perspectiva essencial para a compreensão das Escrituras."1 A Bíblia consistentemente demonstra que as pessoas não estão de tal modo cativas à sua compreensão prévia que não possam ser transformadas.
Em Tessalônica, por exemplo, Paulo "arrazoou com eles acerca das Escrituras, expondo e demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos" (At 17:2-3).
Como resultado "alguns deles foram persuadidos e unidos a Paulo e Silas, bem como numerosa multidão de gregos piedosos e muitas distintas mulheres" (verso 4).
Pressuposições bíblicas
Um Deus pessoal que fala e age
Em nenhuma parte das Escrituras os escritores bíblicos tentam provar a existência de Deus. Em vez disso, é simplesmente afirmado desde o início (Gn 1:1). No Novo Testamento a mensagem é semelhante: os que se aproximam de Deus devem "crer que Ele existe" (Hb 11:6).
Nossa fonte de informação acerca de Deus é a Sua própria revelação pessoal (Hb 1:1-3), fielmente registrada nas Escrituras (Rm 16:26). Embora seja impossível conhecer a Deus completa e exclusivamente, a Bíblia nos provê conhecimento verdadeiro suficiente que nos habilita a entrar em um relacionamento amoroso e salvífico com Ele. O testemunho próprio das Escrituras é de importância decisiva.
Quando falamos do "Deus vivo" queremos dizer que Deus é essencialmente pessoal e que ele fez-se conhecido de uma maneira sumamente pessoal, particularmente na encarnação de Cristo.
Como o Deus vivo, Ele é um Deus pessoal que fala e age. Um dos Seus atos comunicativos pode ser visto em Sua revelação. As coisas que Deus nos revelou são para que conheçamos (Am 3:7; Dt 29:29). A revelação divina gera as Escrituras (cf. 2Pe 1:19-21).
Ao originar as "Sagradas Escrituras" (Rm 1:2), Deus utilizou instrumentalidades humanas. Deus não lhes eliminou a individualidade nem lhes suprimiu a personalidade. E, no entanto, o Espírito Santo conduziu os escritores bíblicos, guiando-lhes a mente e os pensamentos na escolha do que falar e assistindo-os no que escrever para que eles fielmente registrassem em fidedignas e apropriadas palavras as coisas que lhes foram divinamente reveladas.
Deste modo, os adventistas do sétimo dia afirmam que "toda a Escritura é uma indivisível e indistinguível união do divino e o humano."2
A humanidade criada para a comunhão com Deus
Adão e Eva, criados à imagem divina, eram capazes de corresponder a Deus e de entrar em uma comunhão significativa com seu Criador. Deus, que criou o ser humano com a capacidade de falar e pensar, é retratado nas Escrituras como usando a linguagem humana para comunicar-se com os seres humanos (cf. Gn 1:28; 3:9; Ex 4:11-12,15-16; l Sm 3:2). Os seres humanos são descritos como sendo criados com a capacidade de compreender corretamente a Deus. Portanto, são responsáveis diante de Deus, seu Criador.
O poder demolidor do pecado
A entrada do pecado, porém, alterou radicalmente, rompeu e fraturou este inicialmente puro e santo relacionamento com Deus. Apesar de o pecado ter desfigurado e distorcido a imagem de Deus no homem, não a destruiu completamente. De outra forma, o raciocínio e a criatividade humana seriam difíceis de sondar, e exemplos genuínos de amor e sacrifício por outros seriam enigmáticos.3
Conquanto a origem do pecado permaneça um mistério que não pode ser elucidado completamente, é claro que o orgulho, a insatisfação com o cargo e o desejo de ser como Deus foram os pecados que levaram Lúcifer e os anjos caídos a se revoltarem contra Deus (cf. Is 14:12-14; Ez 28:11-19).
O pecado é o desejo de cruzar as fronteiras da condição de criatura na tentativa de tornar-se como Deus, um rompimento da relação essencial Criador-criatura, e o desejo de viver uma vida independente, egocêntrica e auto-suficiente sem Deus. Esta separação de Deus tem afetado nossa natureza humana e corrompido todos os aspectos e dimensões de nossa existência, inclusive nossas faculdades de raciocínio e nossa capacidade de compreensão.
Os efeitos do pecado sobre a interpretação das Escrituras
É raro nas discussões hermenêuticas encontrar uma descrição dos efeitos do pecado sobre a tarefa da interpretação bíblica.4 Contudo, várias predisposições interiores indicadas nas Escrituras são obstáculos para se atingir uma compreensão mais profunda e correta da verdade bíblica. Não é apenas que nosso sistema de pensamento humano seja empregado para fins pecaminosos; nossa mente e nossos pensamentos tornaram-se corrompidos e, desse modo, fechados à verdade divina.
Orgulho
Talvez a principal característica dessa corrupção seja o orgulho. Segundo a Bíblia, o orgulho está na própria raiz e na essência do pecado. Por que os fariseus do tempo de Jesus foram incapazes de reconhecer a Jesus Cristo como o Messias? Jesus os chama de espiritualmente cegos, porque sua orgulhosa pretensão de que "podiam ver" era um obstáculo para reconhecer a auto-revelação de Deus em Jesus (Jo 9:39-41; 12:43).
Em 2Tm 3:2-3 o orgulho ocorre em uma lista que descreve as características dos homens ímpios dos últimos dias. Ele conduz a ensinos errôneos e atos pecaminosos (2Tm 4:3-4; cf. lTm 6:3-4).
Orgulho é uma atitude para com Deus e Sua Palavra em que a pessoa orgulhosa é caracterizada por uma mentalidade arrogante que se eleva a si mesma acima de Deus e de Sua Palavra e, assim, perde qualquer equilíbrio que poderia originar-se de um reconhecimento da verdadeira posição de alguém em relação a Deus e à Sua Palavra.
Deus "resiste aos soberbos, contudo, aos humildes concede a Sua graça" (lPe 5:5). O orgulho leva o intérprete a enfatizar demais a razão humana ou preocupações existenciais como o árbitro final do que alguém deve conhecer, crer e obedecer, e, ao mesmo tempo, deprecia a autoridade divina e a inspiração das Escrituras.5
Não é sem razão que Ellen G. White escreveu: "O pecado que é quase desesperador e incurável é o orgulho de opinião, a presunção. Isto impede todo crescimento" (7T 199-200).
Auto-ilusão. Ligado ao obstáculo do orgulho está o problema da auto-ilusão. O pecado afetou todos os aspectos da nossa existência humana, inclusive nossa maneira de pensar e nossos desejos.
Como pecadores, somos inclinados a ouvir apenas aquelas idéias que nos parecem atrativas, mas que não correspondem necessariamente à vontade revelada de Deus. A auto-ilusão é um perigo real, porque "enganoso é o coração, mais do que todas as cousas" (Jr 17:9). Deus nos tem advertido acerca do perigo da auto-ilusão, que leva a uma compreensão errônea da nossa situação (Ap 3:17).
A auto-ilusão também afeta a devida compreensão da Palavra escrita de Deus (2Tm 4:3-4; cf. 3:13). O apóstolo Paulo instrui Timóteo e todos os crentes a não se tornarem vítimas dessa auto-ilusão. Devem pregar a Palavra e viver um estilo de vida coerente modelado de acordo com a instrução encontrada na Palavra de Deus (2Tm 4:2, 5).
É a Palavra escrita de Deus que constitui uma lâmpada para os nossos pés e uma luz para o nosso caminho (SI 119:105). É o Espírito Santo, operando em nosso coração por intermédio da Palavra de Deus, quem aclara nossa auto-ilusão e ilumina as trevas do nosso entendimento.
Dúvida
A dúvida é uma experiência dolorosa. Duvidar significa "vacilar na opinião de alguém"; significa "estar indeciso acerca da verdade de alguma coisa" e "questionar a veracidade de uma idéia"; o que duvida está "inclinado a não crer na verdade de uma asserção."6
A dúvida como parte de uma metodologia crítica abafa a certeza da Palavra de Deus e enfraquece a convicção da fé. Uma abordagem caracterizada pela dúvida "nunca é capaz, por si mesma, de chegar a um conhecimento salvífico e santificador da verdade divina. Precisamente como a fé é a condição para o conhecimento (2Co 4:13), assim a dúvida ou o ceticismo é a condição para permanecer em ignorância da verdade.7
A incerteza apenas se aprofunda quando uma pessoa duvidosa é confrontada com o testemunho verbal ou escrito da verdade (cf. Jo 5:46-47), "porque tal declaração demanda a transferência de autoridade da própria razão de alguém como o árbitro final para o testemunho que é declarado ser verdadeiro."8
Tem-se salientado que a fonte deste problema "jaz não em uma espécie de evidência apresentada à razão, mas na autônoma postura céptica da razão em face de toda evidência. Quando alguém começa com dúvida, a avaliação do texto nunca levará à certeza."9
O intérprete que duvida das declarações das Escrituras julga a Palavra de Deus e, desse modo, eleva-se a uma posição em que imagina conhecer o que é aceitável e o que não é. Deus, porém, não pede uma atitude de "crítica" e "dúvida" para se obter uma compreensão de Sua Palavra, mas requer fé. Conquanto as Escrituras nos exortem a ser compassivos com os "que estão na dúvida" (Jd 22), Jesus rejeita a dúvida complacente (cf. Mt 16:1-4).
Distância e distorção
A natureza e conseqüência do pecado humano é descrita em Isaías 59:2 como "separação" entre a humanidade e Deus que esconde de nós o seu rosto. Esta foi a experiência de Adão e Eva no jardim do Eden.
Embora Deus ainda procure contato e comunicação com a raça humana, a distância criada pelo pecado leva a uma distorção do nosso conhecimento de Deus. Uma atitude de dissecar criticamente as Escrituras, assim fragmentando e distorcendo sua unidade dada por Deus, é aguçada e estimulada pelo exercício. Nas palavras de Ellen G. White:
“Os que pensam tornar claras as supostas dificuldades da Escritura determinando por sua regra finita o que é inspirado e o que não o é, melhor fariam em cobrir o rosto... Quando homens, em seu juízo finito, julgam necessário fazer um exame de textos para definir o que é inspirado e o que não é, estão dando um passo adiante de Jesus a fim de mostrar-Lhe um caminho melhor do que aquele em que Ele nos tem guiado... Irmãos, nenhuma mente ou mão se empenhe em criticar a Bíblia. É uma obra que Satanás se deleita que qualquer de vós faça, mas não é obra a vós designada pelo Senhor.
“Os homens devem deixar que Deus cuide de Seu próprio Livro, Seus oráculos vivos, como Ele tem feito por séculos. Eles começam a pôr em dúvida algumas partes da revelação, e acham falhas nas aparentes incoerências desta e daquela declaração. Começando em Gênesis, eles rejeitam aquilo que julgam questionável, e sua mente os leva adiante, pois Satanás levará a qualquer extensão a que eles o sigam em sua crítica, e vejam alguma coisa de que duvidar em todas as Escrituras. Suas faculdades de crítica são aguçadas pelo exercício, e não podem repousar em nada com certeza (1ME 17-18, ênfase suprida).
Em vez de ser capaz de ver unidade nas Escrituras, a Bíblia e suas mensagens são fragmentadas quando a razão humana caída aplica pressuposições estranhas e hostis à tarefa de interpretar as Escrituras, resultando em uma perda da autoridade bíblica. Em tal caso, a autoridade é transferida para o intérprete, que escolhe a que voz ele dará ouvidos entre a pluralidade de vozes.
Além disso, a razão humana caída também introduz distorção por meio da interpretação das Escrituras por meio dos "raciocínios falazes" ou "palavras persuasivas" (Cl 2:4; cf. 2Tm 4:3-4; 2Pe 3:16), que, não obstante, enganam. Por exemplo: "A alegação de que não se pode conhecer a verdade absoluta leva à distorção, significando que a verdade das Escrituras será interpretada como informação pessoal em vez de informação concreta que corresponde à realidade."10
A distorção também pode ocorrer quando as preocupações correntes do intérprete não combinam com o que é atinente ao texto e o intérprete faz indagações que o texto não pode responder ou o texto está dando respostas que o intérprete não está preparado para aceitar.
As Escrituras nos dizem que o pecado nos cega quanto à verdade divina (Rm 1; lCo 1-2). Isto significa que o pecado impede o intérprete de reconhecer conclusões autorizadas.
Desobediência
Desobediência, a indisposição de seguir a vontade revelada de Deus, também afeta negativamente nossa capacidade de compreender corretamente as Escrituras. A desobediência é companheira do orgulho e é pecado. O pecado intencional é de fato uma barreira no conhecimento da verdade divina (SI 66:18).
Recusando admitir que precisamos aprender coisas novas da Palavra de Deus, resistimos às verdades espirituais e nos tornamos insensíveis a elas. A oposição persistente e a rejeição da verdade revelada de Deus levam a um ponto em que o desobediente torna-se incapaz de ouvir corretamente e compreender a Palavra de Deus.
Atitudes e pressuposições necessárias para a interpretação das Escrituras
Precisamente porque Deus nos encontra nas Escrituras e nos encontra ali para um propósito específico, a abordagem no estudo da Escritura, em quaisquer outras condições que não sejam aquelas delineadas na Palavra de Deus, é aproximar-se de Deus com uma atitude errada.
Necessitamos de uma disposição de espírito e de coração que leve à compreensão. Isto não é obtido simplesmente por meio de certas técnicas exegéticas.
Abertura e honestidade
Uma das atitudes fundamentais necessárias para uma compreensão adequada da mensagem bíblica é uma mentalidade aberta imbuída de uma disposição para aprender, uma mentalidade receptiva à mensagem e ao conteúdo que estão sendo estudados. Nas palavras de Ellen G. White:
“Ao estudardes a Palavra, deixai à porta de vossas pesquisas as opiniões preconcebidas, bem como as idéias hereditárias e cultivadas. Jamais conseguireis a verdade, caso estudeis as Escrituras a fim de vindicar as próprias idéias... Se, ao lerdes, vos sobrevém convicção, e vedes que vossas acariciadas opiniões não se encontram em harmonia com a Palavra, não tenteis fazer com que esta se conforme com as mesmas opiniões. Ajustem-se elas à Palavra” (MJ 260).
Sem tal honestidade e abertura, nenhuma mudança ou correção é possível no que se refere à precompreensão. A honestidade visa aos motivos com que o intérprete aborda o texto bíblico e também inclui uma abertura ao uso dos métodos adequados de interpretação.
O ponto de partida ideal é uma mente aberta, não uma mente vazia. Ninguém se dirige às Escrituras com uma cabeça vazia. Mas o intérprete tem de abordar o texto bíblico com a disposição de abrir suas convicções fundamentais ao poder transformador do Espírito Santo de Deus, que está operando com a Palavra escrita e por meio dela. Conscientemente, temos de permitir que a Bíblia molde e transforme nossa precompreensão. Deus prova o coração e se agrada da sinceridade (veja lCr 29:17; Pv 2:7).
É dada nas Escrituras a promessa de que qualquer que estiver disposto a fazer a vontade de Deus conhecerá se os ensinamentos procedem de Deus ou não (Jo 7:17). Essa honestidade torna acessível a possibilidade de vencer a subjetividade humana permitindo que Deus fale ao intérprete no texto das Escrituras e por meio dele.
A disposição de aprender da Palavra de Deus habilita o intérprete a entrar num processo de compreensão que pode ser comparado a uma espiral hermenêutica. Em primeiro lugar, conduz de um reconhecimento das idéias bíblicas para uma aceitação dessas idéias e, depois, para uma percepção mais íntima e mais adequada do tema da Bíblia, levando a uma nova investigação e mais profunda compreensão.
Assim, o intérprete bíblico que está disposto a atribuir à palavra das Escrituras a primazia fundamental para o correto significado da mensagem bíblica é capaz de crescer continuamente em sua compreensão dessa mensagem.11
Fé
Sem fé é impossível agradar a Deus (Hb 11:6). O apóstolo já afirmou que uma verdadeira compreensão da Escritura Sagrada só é possível por meio do Espírito Santo (lCo 2:14), que ilumina nosso entendimento a fim de que possamos conhecer (Ef 1:18).
É a fé que torna acessível ao leitor as verdades espirituais da Palavra de Deus. Conquanto as Escrituras possam ser lidas como qualquer outro livro, sem fé não podem ser compreendidas corretamente no sentido bíblico, porque o tema ou matéria de estudo da Bíblia, que é Deus, está disponível apenas ao crente. Saber e compreender no sentido bíblico envolvem muito mais do que simplesmente um reconhecimento intelectual. Também abrangem uma dimensão relacionai e comunicativa que inclui o envolvimento de toda a pessoa no ato de conhecer. Fé é o lugar no qual o conhecer é possível.
A pessoa que tenta ler a Bíblia simplesmente como qualquer outro livro não faz justiça à sua natureza divino-humana. A interpretação das Escrituras não alcança o seu objetivo se for examinada apenas sua dimensão humana. A leitura das Sagradas Escrituras deve ter em vista uma interpretação em que Deus, o Autor das Escrituras, está sendo reconhecido e ouvido. E isto só é possível a partir de uma atitude de fé. Sem fé não é possível nenhum crescimento no conhecimento humano.
O próprio Jesus demonstrou completa confiança nas Escrituras (Jo 10:35). Ele aceitou o cânon do Antigo Testamento (Lc 24:44) e reconheceu as Escrituras como a norma autorizada para nossa vida (Mt 4:4). Não duvidava das Escrituras; em vez disso, apoiava-se nelas como uma palavra fidedigna para derrotar Satanás (Mt 4:6-7).
Depois da Sua ressurreição, Jesus repreendeu os discípulos no caminho de Emaús por serem néscios e "tardos de coração para crer tudo o que os profetas disseram!" (Lc 24:25). A falta de fé leva a uma compreensão deficiente das Escrituras.
Humildade
Uma das mais importantes pressuposições para o conhecimento da verdade é a humildade. A atitude de humildade expressa a disposição e modéstia de alguém em submeter suas crenças a uma autoridade mais elevada. Por intermédio da humildade é obtido o mais alto e mais profundo conhecimento de Deus, ou seja, a consciência de que somos dependentes de Deus para obtermos verdadeiro conhecimento, de que o homem não é a medida final de tudo.
Em vez disso, o intérprete está disponível para ser dirigido e ensinado pelo Espírito Santo. Porque "Deus resiste aos soberbos, mas dá graça aos humildes" (Tg 4:6). A humildade expressa o despretencioso discernimento de que Deus e Sua Palavra são maiores do que nossa razão humana e maiores do que nossa atual compreensão. Há sempre mais luz a irromper da Palavra de Deus.
Esta subordinação da razão humana à autoridade mais elevada da Palavra de Deus é expressa assim:
Deus deseja que o homem exercite suas faculdades de raciocínio... Convém, entretanto, acautelar-nos contra o deificar a razão, a qual está sujeita à fraqueza e enfermidade humanas... Ao lermos a Bíblia, a razão deve reconhecer uma autoridade superior a si própria, e o coração e a inteligência se devem curvar perante o grande EU SOU (CC 110).
Qualquer que quiser compreender a Bíblia, e por meio da Bíblia, a Deus, ao mundo, e a si mesmo, deve permitir que seja dada às Escrituras prioridade normativa sobre suas próprias experiências e avaliações.
Obediência
A obediência é o caminho para mais profunda compreensão. Reflete o princípio bíblico de que ao respondermos à luz que temos é dada mais luz (cf. SI 119:100; At 5:32; l jo 2:3). Na interpretação das Escrituras "não é suficiente ter dominado uma técnica exegética de oito passos; é igualmente um assunto de espiritualidade. Os intérpretes bíblicos têm de ser aprendizes voluntários, estudantes que estão dispostos a viver e a olhar "ao longo do texto", segundo as Escrituras."12
Isso porque a verdadeira finalidade do nosso trabalho hermenêutico é uma vida consagrada. A compreensão bíblica nunca é abstrata e teórica. E a compreensão da vontade e da obra do Deus vivo, que constantemente procura transformar-nos mais plenamente à Sua semelhança.
Destarte, a compreensão bíblica envolve finalmente a reivindicação de Deus sobre nossa vida e o Seu propósito para ela à luz de tudo o que Ele nos tem revelado. Significa conhecer e praticar a verdade divina; tal compreensão é um dom de Deus (Ef 3:16-19; Fp 3:15-16).
Amor
O requisito supremo para a compreensão da mensagem bíblica é simpatizar com o assunto ou matéria de estudo. É um fato indiscutível que para conhecermos realmente e apreciarmos alguma coisa precisamos amá-la. É a virtude do amor, fé e obediência que tornará acessível ao leitor o tesouro da Palavra de Deus. Não se pode amar sinceramente a Deus e criticar sua revelação de longe.
Oração
Por último, mas não menos importante, a oração leva o intérprete a explorar a Bíblia partindo de uma perspectiva diferente. Quando Daniel orou, foi-lhe concedida compreensão e discernimento (Dn 2:18-19; 6:10).
Lemos no Salmo 119:18: "Desvenda os meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei." Pela oração, reconhecemos a necessidade do auxílio do Espírito Santo de Deus a fim de que compreendamos o que Ele inspirou.
Princípios hermenêuticos
Não podemos esperar compreender corretamente a Palavra escrita de Deus se a tratamos como qualquer outro livro. Os princípios de nosso estudo da Bíblia devem então ser coerentes com os princípios que governam todo o nosso relacionamento com Deus.13 Isto significa que o nosso estudo das Escrituras deve ser tanto acadêmico quanto devocional, envolvendo a mente e o coração na pesquisa para descobrir o verdadeiro significado do texto.
Somente pelas Escrituras - sola scriptura
Desde o início os crentes adventistas têm-se considerado como o povo do Livro, literalmente como cristãos crentes na Bíblia na tradição plena dos Reformadores do século 16.14 Os adventistas do sétimo dia reconhecem que para uma interpretação correta das Escrituras, as próprias Escrituras são fundamentais (lCo 4:6).
Portanto, eles ratificam o princípio escriturístico sumarizado no slogan da Reforma: sola scriptura - pelas Escrituras somente. Este apelo reconhece a autoridade única das Escrituras.
As Escrituras somente são a norma predominante (norma normans). Outras autoridades tais como experiência religiosa, razão humana e tradição são regidas pelas Escrituras (elas são normas dirigidas, norma normata). De fato, o princípio sola scriptura foi planejado para salvaguardar a autoridade das Escrituras da dependência de outras fontes, tais como a Igreja, e evitou a possibilidade de que a regra de sua interpretação pudesse vir de fora.
As Escrituras interpretam as Escrituras
Uma característica hermenêutica do princípio sola scriptura é a sua auto-interpretação. Não é a tradição, a razão humana, ou a experiência religiosa, a cultura, ou o veredito de sábios e líderes que constitui a fonte e norma para a interpretação das Escrituras.
As Escrituras somente são a chave que descerra as Escrituras.
Compreender sola scriptura, neste sentido, não exclui a realidade das influências culturais ou a realidade da experiência religiosa. Manter que passagem interpreta passagem não anula o critério de outros campos de estudo, tais como arqueologia bíblica, antropologia, sociologia, ou história, que podem iluminar alguns aspectos bíblicos e os antecedentes de passagens escriturísticas, contribuindo para uma melhor compreensão do significado do texto bíblico. Nem exclui o auxílio de outros recursos no trabalho de interpretação, tais como léxicos bíblicos, dicionários, concordâncias, ciências, e ajudas secundárias. Outras opiniões têm de ser cuidadosamente avaliadas do ponto de vista das Escrituras como um todo.
O princípio de passagem interpretando passagem também não exclui a comunidade da fé ou a razão humana. Quando Lutero manteve o princípio de sola scriptura, ele não estava sugerindo que a tradição da Igreja era sem valor. Antes, ele estava discutindo um caso de relativa clareza e peso. Em outras palavras, se surge um conflito na interpretação da fé, então as Escrituras possuem uma autoridade que transcende e julga qualquer uma das tradições da Igreja.
No caminho de Emaús, Jesus manteve o princípio de que as Escrituras são o seu próprio intérprete. "Começando por Moisés, discorrendo por todos os profetas, expunha-lhes o que a seu respeito constava em todas as Escrituras" (Lc 24:27). Mais tarde, naquela noite, Jesus outra vez aludiu às Escrituras quando esclareceu os discípulos de que tudo o que dele estava escrito "na Lei de Moisés, nos Profetas e nos Salmos" (Lc 24:44) devia se cumprir. Para Jesus, as Escrituras são a fonte autorizada por meio da qual podemos discriminar entre o certo e o errado.
A suficiência das Escrituras
Falar das Escrituras como seu próprio intérprete sugere o corolário da suficiência das Escrituras. As Escrituras são suficientes como o guia inerrante para a verdade divina. É suficiente para tornar alguém sábio para a salvação (2Tm 3:15). É o padrão exclusivo pelo qual toda doutrina e experiência deve ser provada (Is 8:20; Jo 7:17; Hb 4:12).
Para conhecer a Deus e sua vontade não necessitamos de nenhuma outra fonte senão só as Escrituras. A autoridade intrínseca da Escritura como a fonte de sua própria interpretação repousa em seu caráter como a inspirada Palavra de Deus. Todavia, essa divina autoridade é reconhecida somente pelo que é quando o Espírito Santo ilumina a mente.
A unidade das Escrituras
Outro princípio fundamental de interpretação bíblica incluído no princípio sola scriptura é a analogia da fé, ou a analogia (ou harmonia) das Escrituras.15 A própria Escritura afirma que "toda a Escritura é inspirada por Deus" (2Tm 3:16), que "nenhuma profecia das Escrituras provém de particular elucidação", e que "homens [santos] falaram da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo" (2Pe 1:20-21). Tendo a Deus como seu autor supremo e sendo inspirada pelo Espírito Santo, podemos admitir uma unidade fundamental e harmonia entre suas várias partes.
Somente à base de sua unidade podem as Escrituras funcionar como seu próprio intérprete. Só então é possível alcançar uma harmonia em doutrina e ensino. Se não há uma unidade superior nas Escrituras procura-se em vão um ensino normativo delas em qualquer assunto. Sem a unidade das Escrituras, a Igreja não tem nenhum meio de distinguir a verdade do erro e repudiar a heresia. Não há nenhuma base para aplicar medidas disciplinares ou corrigir desvios da verdade divina. As Escrituras perderiam seu poder convincente e libertador.
Os escritores do Novo Testamento, porém, testificam das Escrituras de maneira altamente favorável e admitem sua unidade. Isto se torna óbvio quando eles defendem sua opinião citando várias fontes do Antigo Testamento como de peso igual e harmônico.16 Isto indica que diferentes escritores da Bíblia provêem ênfases diferentes sobre o mesmo evento ou tema, contribuindo, assim, para uma fecunda e multifacetada expressão da verdade divina em que todas as doutrinas da Bíblia concordam entre si. Deus nunca Se contradiz.
Tota Scriptura - Toda a Escritura
A unidade das Escrituras inclui o conceito de tota scriptura (toda a Escritura). A fim de saber o que as Escrituras têm a dizer sobre determinado assunto devemos considerar tudo o que é declarado por elas. A fim de adquirir um discernimento pleno e compreensivo do que Deus quer dizer na Bíblia não é suficiente escolher uma declaração em detrimento de outras declarações sobre o mesmo assunto.
Isto significa que "os dois Testamentos têm uma relação recíproca em que mutuamente se iluminam um ao outro... Nem um Testamento é anulado pelo outro, embora a última revelação seja testada pela primeira."17 O melhor exemplo para esta confiança nas Escrituras aparece entre os cristãos bereanos, que "eram mais nobres que os de Tessalônica; pois receberam a palavra com toda a avidez, examinando as Escrituras todos os dias para ver se as cousas eram, de fato, assim" (At 17:11).
De um modo semelhante, Jesus salientou como o Antigo Testamento esclarece o Novo Testamento. "São elas mesmas [as Escrituras] que testificam de mim" (Jo 5:39). De tais passagens como lTm 5:18, em que Paulo justapõe uma declaração de Jesus com uma citação do Antigo Testamento ou 2Pe 3:15-16, em que Pedro parece reconhecer as cartas de Paulo como Escritura, é claro que já nos tempos do Novo Testamento os escritos apostólicos estavam sendo aceitos como parte das Sagradas Escrituras, juntamente com o Antigo Testamento.18
O contexto de uma passagem bíblica
Além disso, usar as Escrituras como seu próprio intérprete não significa enfileirar indiscriminadamente várias passagens na forma de um solto "texto-prova" sem considerar o contexto de cada passagem. Ao contrário, "sendo que as Escrituras têm, afinal, um único autor divino, é decisivo reunir tudo o que está escrito sobre um assunto específico a fim de sermos capazes de considerar todos os contornos do assunto",19 considerando o contexto literário, bem como histórico, de uma passagem.
O intérprete cuidadoso levará em consideração o contexto imediato antes e depois da passagem sob investigação; o contexto do livro da Bíblia em que a passagem se encontra, bem como o contexto mais amplo de toda a Bíblia. Na comparação de passagem com passagem é importante estudar a Bíblia
inteiramente, se possível em suas línguas originais ou, ao menos, com uma tradução bíblica apropriada e fiel ao significado contido no original hebraico e grego.
A clareza das Escrituras
O apelo para as Escrituras somente faz pouco sentido se os textos são obscuros quanto ao seu significado. A mensagem da Bíblia é suficientemente clara para ser compreendida por crianças bem como por adultos. E, no entanto, o contexto das Escrituras oferece mesmo à pessoa mais letrada ampla oportunidade de crescer em conhecimento e aprofundar a compreensão de Deus e de sua vontade revelada.
A verdade da clareza das Escrituras tem sido reconhecida por muitos cristãos na tradição da Reforma. A Bíblia repetidamente nos lembra de sua própria clareza. As Escrituras podem ser compreendidas não somente por teólogos, sábios, ou sacerdotes, mas por todos os crentes. O testemunho bíblico encoraja os leitores a estudar a Bíblia por si mesmos, porque são capazes de compreender a mensagem de Deus para eles (cf. Dt 6:6-7; SI 19:7; 119:130; Is 34:16; Lc 1:3-4; At 17:11; Rm 10:17; Ap 1:3).
O exemplo coerente dos escritores da Bíblia mostra que as Escrituras devem ser tomadas em seu sentido claro, normal, literal, a menos que seja dada uma figura clara e óbvia ou empregada uma passagem simbólica.20 A clareza das Escrituras admite o sacerdócio de todos os crentes em vez de restringir sua interpretação a uns poucos selecionados, ao sacerdócio clerical, ou à "comunidade" de instruídos eruditos. Isto significa que o estudo das próprias Escrituras, em vez de fontes secundárias e comentários sobre elas, deve ter prioridade.
A clareza das Escrituras e das traduções da Bíblia
A clareza das Escrituras diz respeito à linguagem, sentido e palavras. Uma conseqüência hermenêutica disto pode ser vista no valor de se dominar, sempre que possível, as línguas originais (hebraico, aramaico e grego), a fim de se compreender mais plenamente o significado das palavras bíblicas originais.
Conquanto seja possível estudar a Bíblia comparando-se passagem com passagem, nas traduções muitas expressões idiomáticas da Bíblia ou figuras de linguagem podem ser facilmente perdidas no processo de tradução.21 A fim de descobrir como uma palavra ou conceito é usado nas Escrituras e que conotações estão associadas a essa palavra ou conceito, é indispensável comparar cuidadosamente passagem com passagem. Isto pode ser feito melhor nas línguas originais.
Se uma tradução necessita ser usada, uma tradução formal deve ser preferida a uma tradução dinâmica ou paráfrase.22 Isto não significa que todas as traduções bíblicas devem ser muito literais, pois mesmo as traduções dinâmicas ou paráfrases podem ser adequadas para diferentes necessidades e situações. Contudo, certamente há um lugar importante para traduções literais que fazem menos interpretação para os leitores e, assim, os estimula a fazer mais interpretação para si mesmos, tornando-os menos dependentes do tradutor.
A clareza das Escrituras e passagens difíceis
Apesar de haver nas Escrituras mistérios de fé que podem ser compreendidos suficientemente para serem aceitos pela fé, isto não quer dizer que compreenderemos tudo exclusiva e completamente. Além disso, falar da clareza das Escrituras não significa que não há passagens que serão difíceis de compreender pelo leitor (2Pe 3:16).
Com freqüência não temos conhecimento suficiente de todos os fatos envolvidos para obter uma compreensão clara de algumas passagens. Às vezes a dificuldade de compreender corretamente é talvez não tanto um assunto de "obscuridade" das Escrituras, mas de um obscurecimento de nossa mente pecaminosa e distorcida.
O estudante esclarecido da Palavra de Deus comparará cuidadosamente uma passagem das Escrituras com outras passagens, mudando-se de afirmações claras e não-ambíguas para aquelas que são mais difíceis de compreender. Um importante princípio hermenêutico derivado da clareza das Escrituras é que passagens difíceis não devem ser o ponto de partida em qualquer interpretação. Devemos começar do contexto mais amplo de claras afirmações escriturísticas da verdade.
Felizmente, as Escrituras iluminam nossa mente e compreensão (SI 119:105). Embora até mesmo descrentes possam ler e compreender intelectualmente o sentido literal e histórico das Escrituras (o sensus literae), o iluminador Espírito Santo deve estar presente para que a mensagem seja percebida como verdadeira.
Mesmo o intérprete regenerado necessita de contínuo auxílio e iluminação do Espírito. Desse modo, o verdadeiro significado da mensagem das Escrituras pode ser compreendido apenas por mentes iluminadas pelo Espírito Santo. Somente aceitando-se a mensagem bíblica como verdadeira e seguindo-a em obediência ocorre a verdadeira e plena compreensão.
O princípio cristológico de interpretação da Bíblia
Foi Martinho Lutero que, enquanto validava a autoridade das Escrituras e era o arauto do princípio sola scriptura, também propôs outro princípio hermenêutico que pode ser denominado o "princípio cristológico".23 Esse princípio cristológico tornou-se responsável por uma sutil, porém significativa mudança na compreensão da autoridade e da hermenêutica da Bíblia.
A opinião de Lutero sobre autoridade estava intimamente ligada à sua compreensão do evangelho. Evidentemente, para Lutero, era Cristo e o evangelho da justificação somente pela fé, do qual as Escrituras testificam, que constituíam o centro das Escrituras e essencialmente sua autoridade final.
Aqui, vem à mente o famoso prefácio de Lutero à epístola de Tiago no qual ele afirma que tudo o que não aponta para Cristo ou exclui a Cristo não é apostólico, mesmo que Pedro ou Paulo o ensinasse. Por outro lado, tudo quanto "anuncia" a Cristo é apostólico, mesmo que venha de Judas, Anás, Pilatos ou Herodes. Portanto, para Lutero o conteúdo das Escrituras é Cristo, e, partindo deste fato, ele parece designar reiteradamente sua autoridade.
Todas as Escrituras giram em torno dele como seu autêntico centro. Essa "concentração cristológica" pode ser vista como o elemento decisivo na interpretação de Lutero e o seu uso das Escrituras.24 Assim, Lutero realmente contendia não "pela primazia das Escrituras no sentido estrito, mas pela primazia do evangelho do qual as Escrituras testificam e, portanto, pela primazia das Escrituras como a confirmação do evangelho."25
Conseqüentemente, Lutero valorizava a Bíblia, "porque ela é o berço que sustem a Cristo. Por este motivo, o evangelho da justificação pela graça por meio da fé servia como a chave hermenêutica de Lutero para as Escrituras."26
Segundo Lutero, as Escrituras devem ser compreendidas a favor de Cristo, não contra ele. Isto significa, como tem sido ressaltado, que se uma passagem parece estar em conflito com a interpretação cristocêntica de Lutero, sua interpretação torna-se "crítica da Escritura centralizada no evangelho."27
Cristo e as Escrituras podem ser postos um contra o outro, porque Lutero, em última análise, distinguia a Palavra pessoal (Cristo), a Palavra falada (evangelho) e a Palavra escrita (Escrituras). Esta distinção e classificação leva a um cânon dentro do cânon, em que Cristo Se torna a chave hermenêutica para a compreensão apropriada das Escrituras.
É claro que isto compromete a força do princípio escriturístico, em que as Escrituras são a fonte exclusiva de sua própria elucidação. Porque "se a Escritura é interpretada quer seja por um centro doutrinal ou por uma tradição, não é mais a Escritura que está interpretando a si mesma - antes somos nós que estamos interpretando a Escritura por meio de uma doutrina ou tradição, à qual a Escritura está, em prática, sendo submetida."28 Portanto, não é de surpreender que o método cristológico de Lutero esteja "afiado como uma ferramenta de crítica teológica" em que o intérprete torna-se o juiz e coloca-se acima da Escritura.29
Ellen G. White não tencionava separar Cristo das Escrituras quando escreveu: "O sacrifício de Cristo como expiação pelo pecado é a grande verdade em torno da qual se agrupam as outras. A fim de ser devidamente compreendida e apreciada, toda verdade da Palavra de Deus, de Gênesis a Apocalipse, precisa ser estudada à luz que dimana da cruz do Calvário" (Ev 190).
Ela não estava propondo um centro teológico a funcionar como uma ferramenta para a crítica teológica, um cânon dentro do cânon. Antes, "toda verdade da Palavra de Deus, de Gênesis a Apocalipse, precisa ser estudada à luz que dimana da cruz do Calvário" (Ev 190, ênfase suprida).
Assim, Ellen G. White poderia afirmar a centralidade de certos temas bíblicos sem denegrir outras partes das Escrituras como sem importância. Porque nenhum homem tem o direito de julgar as Escrituras selecionando aquelas passagens que são consideradas mais importantes do que as outras.30 Todas as Escrituras são dada por inspiração e, portanto, são proveitosas para tornar-nos sábios para a salvação (2Tm 3:16).
A relação entre Cristo e as Escrituras
Como devemos então ver a relação entre Cristo e as Escrituras? O Deus vivo e falante das Escrituras preferiu revelar-se por meio da Palavra. Deus também achou adequado confiar sua Palavra falada por meio dos autores bíblicos ao meio ou instrumento de escrita, gerando, assim, a Bíblia, a Palavra escrita de Deus.
Parece que alguém precisa crer nas Escrituras antes que possa crer no Cristo das Escrituras. A Palavra encarnada (Jesus Cristo) não pode ser separada da Palavra escrita (Sagrada Escritura). De fato, existe uma íntima e muito próxima relação entre Cristo e as Escrituras.31
É indubitavelmente verdade que Cristo é central nas Escrituras. O próprio Cristo mostrou aos discípulos como as Escrituras apontam para Ele (Lc 24:25-27). As Escrituras testificam de Cristo (Jo 5:39). No entanto, temos de distinguir cuidadosamente entre um tema central ou pessoa nas Escrituras e postular um centro teológico por meio do qual outras porções e declarações das Escrituras sejam relegadas a uma posição secundária ou inferior.
Um centro teológico que funciona como uma chave hermenêutica conduz apenas a um cânon dentro do cânon que não faz justiça à plenitude, opulência e amplitude da verdade divina conforme a encontramos em todas as Escrituras.
Precisamos permitir que as Escrituras em sua inteireza {tota scriptura), em todas as suas vozes e estilos multifacetados, nos revelem a riqueza e profundidade da sabedoria divina. Somente tal leitura sinfônica da Bíblia, sob a unificadora orientação do Espírito Santo, será capaz de fazer justiça aos múltiplos fenômenos das Escrituras.
Deus envia o Espírito Santo para nos guiar à Palavra Viva (Jesus Cristo) por meio da Palavra escrita (Sagradas Escrituras). As Escrituras são fundamentais para nossa fé e devoção, porque não há nenhum outro testemunho explícito de Jesus Cristo. Não temos nenhum outro Cristo além daquele que os escritores bíblicos nos apresentam.
A Bíblia é o lugar em que Deus nos falou acerca de Si mesmo. "Curvar-se ao Senhor vivo impõe submeter a mente e o coração à Palavra escrita. Os discípulos individualmente e as igrejas corporativamente estão sob a autoridade das Escrituras porque estão sob o domínio de Cristo, que governa pelas Escrituras. Isto não é bibliolatria, mas cristianismo em sua forma mais autêntica."32
O Espírito de Cristo, que habita nos cristãos, nunca os leva a duvidar, criticar, ir além, ou ter em pouca conta os ensinos bíblicos. Ao contrário, o Espírito Santo nos leva a apreciar a autoridade divina das Escrituras. O princípio sola scriptura sem Cristo é vazio, mas e Cristo sem as Escrituras? De quem Ele é filho? Sem as Escrituras não conheceríamos a Jesus como o Cristo messiânico, e Ele poderia não ser nosso Salvador.
Desse modo, nossa lealdade à Bíblia é parte de nossa lealdade a Cristo. O que é necessário não é nossa crítica humana às Escrituras - nem mesmo em nome de Cristo - mas o exame crítico de nós mesmos, da Igreja e de todas as outras áreas pelas Escritura para o qual somente o texto bíblico é divinamente apropriado. Por intermédio disto permitimos que as Escrituras sejam o princípio controlador e autoridade final para a teologia, fé e prática.
Sola Scriptura ou Prima Scriptura
Afirmar que as Escrituras são a fonte final e exclusiva para sua própria interpretação é mais do que defender a primazia delas. Isto é afirmado até mesmo pela Igreja Católica Romana.33 Entretanto, no dogma católico romano é a Igreja, e somente a Igreja, com sua tradição, que reivindica o direito de interpretar as Escrituras autenticamente e com autoridade.34 Assim, as Escrituras, embora sejam a fonte primária para a teologia, são domesticadas pelos óculos hermenêuticos da Igreja e sua tradição. Contra isto é que os reformadores protestantes protestaram quando afirmaram sola scriptura.
Optar meramente pela primazia das Escrituras, em vez de pelas Escrituras somente como a norma final e autoridade suprema para a fé e prática, é separar-se do princípio protestante de que as Escrituras somente são a norma final para a teologia e a fonte exclusiva de sua própria interpretação.
O protestantismo reivindicava mais do que a superioridade das Escrituras diante de outras fontes, ou mesmo sua prioridade. Reivindicava que as Escrituras somente são a fonte exclusiva de sua própria exposição. Caso contrário, as Escrituras não podem ser mais a autoridade final em teologia, nem podem ser o lugar em que se origina a reflexão teológica e atinge sua conclusão.
Autor: Frank M. Hasel, Ph.D., Professor de Teologia no Bogenhofen Seminary
Fonte: Compreendendo as Escrituras, Unaspress
Referências
1. Gerhard E Hasel, Understanding the Living Word of God ((Mountain View, CA: Pacific Press, 1980), p. 71-78.
2. Richard M. Davidson, "Biblical Interpretation", in Handbook of Seventh-day Adventist Theology, ed. Raoul Dederen (Hagerstown, MD: Review and Herald Publishing Association, 2000), p. 62. Sobre o ensino bíblico de revelação e inspiração, veja também o equilibrado artigo de Peter M. van Bemmelen, "Revelation and Inspiration", in Handbook of Seventh-day Adventist Theology, p. 22-57.
3. John M. Fowler, "Sin," in Handbook of Seventh-day Adventist Theology, p. 236.
4. Uma notável exceção é a discussão em Culture and Biblical Hermeneutics: Interpreting and Applying the Authoritative Word in a Relativistic Age, de WilliamJ. Larkin (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1988), p. 293-304. Sou também grato a Jens Schwenger por ter tornado disponível sua pesquisa sobre este assunto e por estimular discussões que me têm indicado alguns destes importantes aspectos da hermenêutica bíblica. Contudo, assumo a responsabilidade pelo conteúdo e conclusões alcançadas neste estudo.
5. Sobre a função da razão humana na teologia, veja "Theology and the Role of Reason", deFrankM. Hasel. Journal of "the Adventist Theological Society 4, n° 2 (1993), 172-198.
6. Peter A. Angeles, "Doubt", in Dictionary ofPhilosophy (New York: Barnes and Noble, 1981), p. 65-66.
7. Larkin, p. 295.
8. Ibidem.
9. Ibid., p. 296.
10. Ibid., p. 298.
11. Helge Stadelmann, Grundlinien eines bibeltreuen Schriftverstãndnisses (Wuppertal: R. Brockhaus Verlag, 1985), p. 94.
12. Kevin Vanhoozer, "The Voice and the Actot: A Dramatic Proposal About the Ministry and Minstrelsy ofTheology", in Evangelical Futures: A Conversation on Theological Method, ed. John G. Stockhouse, Jr. (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 2000), p. 85.
13. David Cupples, The Devotional Life of a Theological Student (Leicester, Inglaterra: Religious and Theological Studies Fellowship, 1987), p. 10.
14. Em 1847, vários anos antes de a Igreja Adventista do Sétimo Dia ser formalmente organizada em 1863, Tiago White achou necessário declarar publicamente sua fidelidade ao princípio protestante histórico sobre autoridade religiosa quando escreveu: "A Bíblia é uma revelação perfeita e completa. E a nossa única regra de fé e prática" (James White, A Word to the Little Flock, 1847), p. 13. De maneira semelhante Ellen G. White declarou que "Há em nosso tempo... necessidade de uma volta ao grande princípio protestante - a Bíblia, e a Bíblia só, como tegra de fé e prática" {GC [1888] 204-205, ênfase suprida).
15. Davidson, p. 64.
16. Davidson tem salientado que "em Romanos 3:10-18, por exemplo, temos citações escriturísticas de Eclesiastes (7:20), Salmos (14:2, 3; 5:10; 10:7) e Isaías (59:7-8). As Escrituras são consideradas como um todo inseparável e coerente" (Davidson, p. 64).
17. Ibidem.
18. Peter M. van Bemmelen, p. 37.
19. Davidson, p. 65.
20. Ibidem. Isto se aplica também às parábolas. Elas são histórias que ilustram verdades espirituais. Apesar de os detalhes concernentes a pessoas, eventos, épocas e lugares nas parábolas possam não ser realmente históricos, as verdades espirituais que elas transmitem são literais e reais.
21. Uma obra-padrão sobre este assunto ainda é Figures of Speech Used in the Bible, de E.
W. Bullinger (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 1995, [originalmente 1888]; também Sprachliche Stilfiguren der Bibel: Von Assonanz bis Zahlenspruch, de Walter Bühlmann e Karl Scherer (Giessen: Brunnen Verlag, 1994).
22. Cf. Gerhard E Hasel, p. 100-105, sobre as diferenças daquelas traduções.
23. Foi a coragem de Lutero de enfatizar as Escrituras somente como a norma autorizada pela qual toda doutrina da Igreja deve ser provada que parece ter mais impressionado Ellen G. White acerca do grande reformador protestante. Ellen G. White claramente não aprovava tudo o que Martinho Lutero disse ou ensinou (cf. O Grande Conflito, capítulos 7 e 8, p. 120-170, esp. p. 139, 148-149).
24. Cf. FrankM. Hasel, Scripturein the Theologies of W. PannenbergandD. G Bloesch: An Investigation and Assessment of Lts Origin, Nature, and Use (Frankfurt: Peter Lang, 1996), p. 44-46.
2 5. Stanley J. Grenz, Renewing the Center: Evangelical Theology in a Post- Theological Era (Grand Rapids, MI: Baker Book House, 2000), p. 57-58.
26. Ibid., p. 58.
27. Paul Althaus, The Theology of Martin Luther, trad. Robert C. Schultz (Filadélfia: Fortress Press, 1966), p. 81.
28. Brian Gaybba, The Tradition: An Ecumenical Breakthrough? (Roma: Herder, 1971), p. 221.
29. Werner Georg Kümmel, The New Testament: The History of the Investigation of Its Problems, trad. S. McLean Gilmour e Howard C. Kee (Nashville: Abingdon, 1972), p. 24.
30. "Não permitais que qualquer ser vivente venha a vós e comece a dissecar a Palavra de Deus, dizendo o que é revelação, o que é inspiração e o que não é, sem uma repreensão... Não queremos que ninguém diga: "Isto eu rejeitarei, e isto eu receberei", mas queremos ter fé implícita na Bíblia como um todo e como ela é" (Ellen G. White, 75C919, ênfase suprida, cf. PJ39; 1ME 17, 42, 245; 5T700-701; 8T319).
31. Um estudo definitivo sobre a compreensão e uso das Escrituras por Jesus é Christ and the Bible, de John Wenham (Grand Rapids, MI: Baker Books, 1994).
32. James I. Packer, Truth and Power: The Place of Scripture in the Christian Life (Wheaton, IL: Harold Shaw Publishers, 1996), p. 40. O termo "bibliolatria" subentende que a Bíblia está sendo transformada em um ídolo. Como protestantes não adoramos o papel e tinta e a capa de couro que irão formar uma Bíblia. Amamos esse Livro por causa de sua mensagem. Suas palavras verdadeiras são entesouradas em nosso coração porque cremos que Deus queria comunicar sua mensagem por meio dessas palavras e que é por meio dessas palavras que nosso coração pecaminoso é levado para mais perto do Senhor Jesus Cristo.
33. Cf. Catechism of the Catholic Church (Libreria Editrice Vaticana, 1994), pp. 26-38.
34. "A tarefa de prover uma interpretação autêntica da Palavra de Deus, quer em sua forma escrita ou na forma de tradição, foi confiada somente ao magistério vivo da Igreja. Sua autoridade neste assunto é exercida em nome de Jesus Cristo." [DV 10 .§ 2]. Isto significa que a tarefa da interpretação foi confiada aos bispos em comunhão com o sucessor de Pedro, o Bispo de Roma" (Catechism of the Catholic Church, p. 27). "Está claro, portanto, que na supremamente sábia providência de Deus, a sagrada Tradição, as Sagradas Escrituras e o Magistério da Igreja estão de tal forma unidos e associados que um deles não pode subsistir sem os outros" [DV10 § 3] (ibid., p. 29).
Bibliografia selecionada
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