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postado em: 17/7/2008
Os Adventistas Frente ao Século 21 A 57ª assembléia da Associação Geral é agora história. Toronto nos trouxe um sentimento de realização. Fomos encorajados pelos relatórios de crescimento de membros em muitos lugares, pelo entusiasmo dos jovens reafirmando alegremente sua fé, e pelos planos especiais para testemunhar aos que ainda não foram alcançados. Como nossos pioneiros se teriam regozijado e admirado com a vasta assembléia de mais de 60.000 entusiásticos crentes de quase todos os cantos do globo, e com a notícia de um efetivo de 11 milhões de membros no mundo! Os missiologistas ficam admirados com o crescimento da Igreja Adventista, com a amplitude de seu alcance mundial, e ainda mais com a estabilidade e fidelidade das comunidades que forma. Isso é bastante encorajador. Contudo, embora nos regozijemos com o que tem sido realizado, somos constrangidos a ver o mundo como Deus o vê, com seus necessitados, os não-alcançados e os insatisfeitos, e a nos vermos desafiados, à luz da eternidade, em nosso discipulado. Sobre vocês, jovens, repousa em larga medida a responsabilidade pelo testemunho futuro da igreja, pouco importando a profissão para a qual vocês estão se preparando ou na qual estão engajados. Seu tempo de se envolver e comandar chegou, quer seja em posições de liderança leiga ou em direta conexão com o ministério do evangelho. Sua eficácia como testemunhas dependerá das decisões que vocês agora fazem, das linhas de discipulado que agora adotam em sua vida, e da visão do mundo que constroem. Mudanças globais dramáticas No que diz respeito à missão adventista, precisamos notar quatro fenômenos demográficos surpreendentes ocorridos no século 20: O assombroso crescimento da população mundial. A população do mundo cresceu mais em apenas 25 anos, durante o século passado, do que em todos os séculos anteriores a 1900. (Ver o quadro no final do artigo) A urbanização do mundo. Ela tem sido acompanhada de mudanças dramáticas em quase todas as dimensões da situação social humana. A expansão global do cristianismo. Apenas no início da década de 40 é que o cristianismo se tornou verdadeiramente global. O final do século passado testemunhou três vezes e meia mais cristãos do que no começo. O admirável crescimento do adventismo. A igreja cresceu de cerca de 76.000 para 11,5 milhões durante o século 20, ou seja, 150 vezes mais do que quando os pioneiros encetaram sua empresa missionária. Os cristãos entre os povos do mundo [1] Ao considerarmos essas estatísticas, precisamos evitar duas tentações. Primeira, o triunfalismo. A distância a percorrer e o trabalho que resta fazer, e não o que foi realizado, devia conter nossos pensamentos e manter-nos humildes. Segunda, os números são impessoais e a consideração das estatísticas tende a despersonalizar a equação. Precisamos lembrar-nos de que cada pessoa entre os bilhões é alguém cuja vida é de inestimável valor diante de Deus e cujos sentimentos estão sujeitos às mesmas forças que os nossos. Desafios de números e cidades O primeiro grande desafio que enfrentamos é o dos números. Enquanto o número de cristãos no mundo cresceu dramaticamente de meio bilhão para dois bilhões durante o século passado, o número de pessoas não alcançadas pelo cristianismo cresceu de um para quatro bilhões. Não é, portanto, tempo para pensamentos acanhados, e nem se deve procurar a solução somente em programas de mídia de massa. Membros de vários grupos culturais e religiosos precisam ser alcançados mediante meios que lhes apelem diretamente e os envolva pessoalmente. Estudiosos dedicados e competentes são necessários ao trabalho porque podem penetrar profundamente na experiência dos componentes de tais grupos, a fim de experimentarem a atração de sua religião e prover respostas cristãs satisfatórias. Esse é um desafio enorme, que vai exigir muito estudo sério e contato pessoal. O caminho está agora mais aberto do que antes, porque há adventistas nessas sociedades cujas vidas são um testemunho do poder do evangelho e cuja experiência é uma fonte da qual muito pode ser extraído. O segundo é o grande e multifacetado desafio das cidades. É aqui que as maiores oportunidades serão encontradas e talvez conhecidos os maiores fracassos da igreja. Metade da população do mundo mora agora nas grandes cidades — os ricos e os miseráveis, os letrados e os iletrados, os líderes intelectuais da sociedade e os vagabundos, os grupos de cristãos vibrantes e as fortalezas dos maiores adversários do cristianismo. Sobejam desafios de toda espécie. Considerando quem vocês são, amigos leitores, vamos enfocar alguns dos aspectos mais intelectuais desse desafio. O desafio intelectual Em geral, não se tem dado atenção suficiente para prover respostas cristãs à busca da geração contemporânea pelo significado na vida. Há sinais sutis de fome espiritual, de uma procura intelectual pela verdade transcendente que provê significado e forma à existência humana. Durante a última geração, linhas de pensamento sofreram amplas mudanças — da posição racionalista do modernismo para um sentimento geral das limitações do pensamento e conhecimento humanos, transformações essas que provêem novas aberturas e desafios. A mentalidade pós-moderna é caraterizada pelo reconhecimento da vastidão e complexidade da realidade, da inadequalibidade de nosso aparato físico e teórico para sondar as profundezas de tudo, e do caráter experimental de todo o conhecimento humano. Não há mais confiança cega quanto às leis da realidade e o conhecimento exato e objetivo. Essa nova mentalidade abre novas avenidas para a discussão de conceitos sobre uma divindade transcendente e de um relacionamento entre Deus e seres humanos. A teologia adventista provê um fundamento positivo para tal discussão por causa de: * Sua crença num Deus amoroso, que enfatiza tanto a transcendência divina como Sua imanência. Deus controla tudo que existe, é atuante na história humana e está próximo de cada um de nós. Isso adquire um sentido especial, visto que “Deus deu Seu Filho unigênito a fim de que Se tornasse membro de família humana, retendo para sempre Sua natureza humana”. [2] * Seu realismo cristão concernente ao pecado e ao mal neste mundo, o qual se abstém de afirmar que a imagem de Deus em seres humanos foi destruída pela Queda. Além disso, ele mantém uma visão otimista para a realização e desenvolvimento do potencial humano nesta vida, pela graça de Deus. * Sua combinação da soberania de Deus na salvação, com ênfase sobre a responsabilidade humana. Rejeita assim a doutrina do determinismo divino na salvação, em favor de uma afirmação da liberdade da vontade humana. * Seu equilíbrio entre a brilhante esperança escatológica e o valor da vida na Terra agora, semelhante à harmonia entre a obra de Deus na criação (celebrada no sábado) e Sua obra de salvação. Eis um desafio para os jovens universitários e profissionais adventistas: Traduzir esses grandes temas teológicos do adventismo, de modo a estabelecer diálogo e partilhar o evangelho com os intelectuais de hoje. O desafio do coração Mas há mais no desafio de ir ao encontro de pensadores urbanos do que a elucidação da mensagem. A religião é tanto uma questão do coração — em relação às emoções e experiência — como da mente. Ela acha sua expressão geral no culto corporativo a Deus. Lembro-me de ter ouvido um professor da universidade dizer por que abandonou uma igreja evangélica para se tornar episcopal. “Eu estava cansado”, disse ele, “de ser importunado e admoestado continuamente e de me dizerem o que fazer. Eu queria adorar a Deus com todos os meus sentidos, em quietude e beleza, e na participação congregacional na oração, confissão e profissão de fé, mas meu grupo simplesmente não sabia como adorar”. Alguns que se uniram à Igreja Adventista têm expresso a mesma insatisfação com a experiência de culto entre nós. Os pontos mencionados incluem: não cultivar adequadamente o senso de estar na presença divina; insuficiente participação da congregação em orações, confissões de fé e leitura das Escrituras; não participação na Santa Ceia com profundeza e seriedade, etc. Se tivermos êxito em trazer membros da elite urbana à igreja, encontrarão eles o calor da comunhão e a profundidade de experiência no culto que estão procurando? O desafio multicultural urbano Dizia-se outrora que o Sol nunca se punha sobre o império britânico, mas agora o mundo está em Londres e em todas as grandes cidades. A trágica ironia da situação é esta: Agora que todos vivemos juntos, há menos relacionamento recíproco e compreensão do que antes. Nessa nova situação, o campo missionário que antes estava do outro lado do mundo pode estar à nossa porta. Outra ironia: O cristão que transpõe o oceano num empreendimento missionário mal se preocupa em cruzar a rua para visitar um jainista (religioso indiano seguidor de ensinamentos opostos ao bramanismo), um sique (adepto do siquismo que segue as doutrinas de uma religião monoteísta fundada em o norte da Índia no século 16, e que combina elementos do hinduísmo e do islamismo), um hindu, um budista, um maometano, ou um vizinho secularista. E isso apesar do bem conhecido fato de que, em geral, os novos imigrantes respondem positivamente e com maior probabilidade de sucesso às manifestações de amizade e ajuda, e são menos impedidos pelo constrangimento de amigos e parentes ao darem uma resposta positiva ao evangelho, do que se estivessem dentro de sua sociedade tradicional. No passado, muitas igrejas pareciam preferir, e mesmo defender, um estilo monocultural de culto congregacional. Com a multietnia das cidades, essa atitude é um desafio a ser vencido. Mas se trouxermos imigrantes interessados ou outros grupos étnicos à igreja, vamos saudá-los em nosso meio sem exigir que se tornem como nós? O evangelho nos confere uma identidade que transcende a todas as identidades culturais e paroquiais, mas sabemos por experiência que embora aceitemos isso em nosso coração, cada um de nós é tão moldado pela cultura de nossa sociedade que o ajustamento prático não é fácil. Antropólogos e sociólogos sugerem que uma congregação auferiria enorme benefício em ter cientistas sociais cristãos explicando as funções da cultura a grupos dentro da igreja, desarmando circunstâncias geradoras de conflitos, e sugerindo meios de maximizar um senso verdadeiramente cristão de harmonia. Eis um desafio aos futuros cientistas sociais entre nós. Mais preocupações pessoais Temos abordado sinteticamente alguns dos desafios externos que a igreja enfrenta. Mas falharemos em nosso dever se não considerarmos duas importantes influências intelectuais e culturais que podem sutilmente se infiltrar na cosmovisão do discípulo de Cristo em relação à sociedade contemporânea. Esses são: o humanismo secular e o individualismo institucionalizado. O secularismo se refere à tendência intelectual de considerar o cosmo físico como tudo o que existe, e negar a atividade de Deus na história humana. As pressuposições da vida acadêmica contemporânea são largamente baseadas no humanismo secular. O discípulo de Cristo precisa reconhecer essa linha de pensamento pelo que ela é e não ser influenciado por ela. O estudante cristão alerta devia reconhecer a superficialidade e as limitações dessa cosmovisão e conscienciosamente afirmar a profundeza abissal e o valor do teísmo cristão. Pode ser útil ler livros de autores evangélicos que combatem essas tendências. [3] Segundo, nossa inclinação para o egocentrismo nos torna vulneráveis ao individualismo institucionalizado de nossa época. Muitos jovens querem estar livres para fazer o que lhes apraz, isto é, até que a calamidade desabe sobre eles. Nossa sociedade contemporânea, com sua orientação para o sucesso a todo custo e o complexo de estrela de cinema, os encoraja nessa direção. Mas o individualismo desembaraçado produz um ego vazio. Pretende ele que a pessoa que quer subir na vida deve deixar o lar, amigos, igreja e tudo o mais que impeça o progresso, com o fim de alcançar posição e meios num mundo impessoal de competição intensa. A literatura especializada está repleta de evidências da ação destrutiva de tal individualismo para a família, a sociedade e finalmente, para o próprio indivíduo. Muitos estão redescobrindo que a vida que vale a pena ser vivida é a comunitária. Um dos grandes desafios que cada um de nós enfrenta é o de recuperar a profunda perspectiva comunitária, na qual a igreja, como povo bíblico de Deus, foi formada. A fé cristã é experimentada mais intensamente dentro do relacionamento com outros, e o testemunho mais eloqüente do poder regenerador do evangelho é o de uma amorosa comunidade de cristãos. Nossa busca de títulos acadêmicos e êxito profissional devia conduzir-nos a uma experiência que se vale da alegria de testemunhar da veracidade do evangelho, que promove conceitos cada vez mais claros da maior verdade do Universo e afirma a camaradagem calorosa de uma comunidade cristã feliz. Autor: Russell Staples (Ph.D. pela Princeton Theological Seminary) serviu à Igreja Adventista por mais de 50 anos como pastor e professor em diferentes partes do mundo. Por 30 anos ele tem estado ligado com o Seminário e o Instituto de Missão Global na Andrews University. Este artigo foi adaptado de seu livro, Community of Faith: The Seventh-day Adventist Church in the Contemporary World (Review and Herald, 1999). Endereço do Dr. Staples: Theological Seminary; Berrien Springs, Michigan 49104; EUA. E-mail: [email protected] Notas e referências 1. Ver David Barrett, Annual Statistical Table on Global Mission, International Bulletin of Missionary Research, janeiro de 2000; e também 136th Annual Statistical Report, 1988 (Silver Spring, Mariland; General Conference of Seventh-day Adventists, 1999). 2. Ellen G. White, O Desejado de Todas as Nações (Santo André, S. Paulo: Casa Publicadora Brasileira, 1979), pág. 21. 3. Consulte, por exemplo, os livros de George Marsden: The Soul of the American University (New York: Oxford University Press, 1994) e The Outrageous Idea of Christian Scholarship (New York: Oxford University Press, 1997) e Kelly James Clark, Philosophers Who Believe (Downers Grove, Illinois: InterVarsity Press, 1993).