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postado em: 5/9/2008
A Cultura da Celebridade
É muito comum alguém aceitar a Cristo e se comprometer com Ele, aos 10 ou 11 anos de idade. Por isso, um casal, conhecido meu, levou sua filha, Melinda*, de 10 anos, a uma reunião evangelística dirigida por um dos pregadores mais importantes da Igreja Adventista de hoje. Eles tinham orado para que o Espírito Santo trabalhasse no coração da menina.
A reunião foi muito boa. O “ilustre pregador” não poderia estar em melhor forma. Os pais de Melinda esperaram para ver o que sua filha faria no fim da mensagem.
Para alegria deles, Melinda foi a primeira pessoa a se levantar. Ela foi à frente tão rápido, antes mesmo de a “figura importante” terminar o apelo.
Quando a menina chegou lá na frente, aproximou-se do pastor e... pediu-lhe um autógrafo!
Esse episódio não desmerece nem a Melinda e, certamente, nem o pregador. É, talvez, um pequeno indício de que temos a cultura da celebridade em nossa igreja.
Há ainda outras evidências desse fato. Os pastores distritais não hesitam em dar o púlpito para qualquer “estrela” que possa estar em sua cidade.
E como a posição geográfica da “estrela” aparece na Internet, o fenômeno da congregação itinerante tornou-se mais evidente. Existe a grande tendência de seguir os “grandes nomes” ao lugar em que estejam pregando.
Antes da era do DVD, uma instituição de mídia adventista vendia fitas de vídeo de oradores internacionais famosos. Os vídeos de três oradores, em especial, que poderíamos chamar de “estrelas’ eram os mais populares.
Por alguma razão, os três oradores há muito tempo deixaram de fazer parte do cenário da Igreja Adventista. Seu status de celebridade, pelo que parece, levou-os a extremos tanto em suas crenças como em sua conduta.
Há alguns anos, o conhecido jogador de “criket” inglês, David Shepherd, tornou-se o bispo anglicano de Liverpool. Por ser eu mesmo um seguidor de estrelas, fui assistir a um culto vespertino naquela catedral.
Cheguei a tempo de ver Shepherd à frente de uma procissão que vinha de fora da nave da catedral, entrando por seu corredor principal até o altar. Ele estava carregando um enorme cajado de pastor.
Perguntei-lhe, então, a razão do cajado. Ele assumiu uma postura de timidez e humildade, fez uma observação sobre a indumentária de bispo com a qual se vestia, e explicou que o “cajado” era uma lembrança simbólica da “natureza do seu trabalho’ fazendo assim um inevitável trocadilho com seu sobrenome (Shepherd, em inglês, significa Pastor).
A cultura de celebridade que nos atinge e o “marketing” religioso que, às vezes, coloca em evidência um tipo superficial de religião, não seria também uma simbólica lembrança da “natureza do nosso trabalho”?
“Vocês não são pastores!” anunciava enfaticamente um orador em um encontro de ministros, recentemente. “Vocês são apenas a ovelha líder!”
Pense nisso!
Um grupo de adventistas da República da Irlanda viajou à Inglaterra para uma reunião campal. Eles, entretanto, participaram de apenas um desses encontros.
“Nós desistimos das reuniões campais”, disseram, “quando vimos tanta gente disputando um autógrafo do pregador ‘famoso’!”
Você reconhece a existência da cultura da celebridade, “marketing” religioso, ou como queira chamá-la? Isso não é aceito por muitos de nós, pelo contrário, é inaceitável.
Lembra-se do que Jesus disse quando Tiago e João queriam entrar no terreno da cultura da celebridade? Eles perceberam claramente que, no reino de Deus, não são promovidos aqueles que têm uma autopromoção agressiva, mas é Deus, e não nós, quem determina a quem Ele honra.
Esse foi mais um motivo para os outros dez discípulos — que ficaram, talvez, muito irritados por não terem reivindicado lugares importantes para si próprios — a ficarem indignados com Tiago e João. Foi então que Jesus teve a oportunidade de falar sobre Suas idéias, opostas às do mundo, sobre grandeza e liderança.
“Mas Jesus, chamando-os para junto de Si, disse-lhes:
Sabeis que os que são considerados governadores dos povos têm-nos sob seu domínio, e sobre eles os seus maiorais exercem autoridade. Mas entre vós não é assim; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva; e quem quiser ser o primeiro entre vós, será servo de todos. Pois o próprio Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a Sua vida em resgate por muitos” (Mc 10:42-45, ênfase acrescentada).
A frase “mas entre vós não é assim” corretamente traduzida é “não deve ser assim entre vós”.
A igreja não deve funcionar do mesmo modo de outras organizações. Da primeira pessoa à última, a igreja é uma sociedade alternativa na qual o primeiro é o último e o último é o primeiro. Sempre que virmos estratificações e divisões assumidas pela sociedade humana, precisamos nos lembrar de que: “não deve ser assim entre vós”.
A Bíblia diz: “todo homem” (e isso inclui as mulheres) serão atraídos a Jesus quando Ele for exaltado (ver João 12:32). Não é isso que acontece quando o pregador é exaltado. E esse “exaltado” impróprio não é culpa do pregador. A verdade é que ele ou ela estão tentando “exaltar a Jesus”. O problema está na atitude dos ouvintes para com o pregador.
Jesus era e é o Filho do homem. Daniel profetizou que chegaria um tempo em que “todos os povos, nações e homens de todas as línguas” serviriam o Filho do homem (Dn 7:14). E Jesus, o Filho do homem, que cumpriu a profecia de Daniel, veio, não para ser servido mas para servir. Ao servir, Ele cumpriu outra grande profecia do Antigo Testamento: o Servo Sofredor descrito em Isaías 42 e 53: “Mas Ele foi traspassado pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre Ele, e pelas Suas pisaduras fomos sarados” (Is 53:5).
Devemos imitar o modelo de liderança serviçal de Jesus. Certamente não podemos imitá-Lo em Sua missão específica de ser “resgate para muitos”; somente Jesus poderia fazer o que nunca terá que ser feito outra vez. Mas podemos imitá-Lo negligenciando o nosso próprio interesse. Foi isso que O capacitou a escolher a morte em vez da glória que Lhe era devida.
Para isso, precisamos de um ajuste em nosso comportamento e nossas atitudes. Não devemos exaltar a humanidade. Exaltar homens e mulheres só irá inflá-los e estragá-los. Exalte Jesus, e tudo será diferente.
Note que em “todo homem” de João 12:32, a palavra “homem” está em itálico: ela foi acrescentada. O texto, na realidade, diz somente “todo”.
Jesus é o grande magnético [imã] de todos os tempos. Idolatrando aqueles que O exaltam, somente atrapalhamos o magnetismo do Salvador.
Jesus não precisa [nem deve] ficar na sombra de um pregador. O pregador é que precisa esconder-se à sombra da cruz.
Autor: David N. Marshal.
Fonte: Adventist World, outubro de 2007
Nota do Editor:
Esse é um assunto que precisa ser mais apresentado em nossas mensagens, analisado e debatido nos Cultos JA [que, infelizmente, são uma piada – de mau gosto, por sinal – em muitas das nossas igrejas*] para que haja uma devida conscientização dos membros, principalmente juvenis e jovens, quanto ao papel dos pregadores, cantores, diretores de Clubes de Desbravadores e outros no contexto da missão. Nunca esqueço o que ouvi de um dos maiores pregadores da IASD, a nível mundial, num grande evento – Projeto SOL – que acompanhei como Redator da CPB, em Vitória-ES: “Certa ocasião, Deus tinha uma mensagem importante para dar para um profeta; como não tinha nenhum outro ser humano para levá-la, Deus usou uma mula. Nós, pregadores, não passamos de mulas! O importante é Jesus! O importante é a mensagem!” Concordo com tudo o que David Marshal fala; só não concordo 100% quando ele diz: “E esse “exaltado” impróprio não é culpa do pregador. A verdade é que ele ou ela estão tentando “exaltar a Jesus”. O problema está na atitude dos ouvintes para com o pregador”. Na verdade, SEMPRE quando isso acontece – de o homem ser exaltado no lugar de Jesus – a culpa maior é dos ouvintes; no entanto, pregadores, cantores, músicos e outros que se põem em evidência, quando não verdadeiramente convertidos e consagrados ao Ministério que desenvolvem (este sim importante!), assumem uma importância e buscam uma glorificação pessoal que – “simplesmente” – tira Jesus de cena. É como diz o escritor Morris Venden: Muitos levam à sério demais a letra daquele velho hino que diz: “Sim há de ser glória pra mim! Glória pra mim! Glória pra mim!”